PMSP/SMC
São Paulo, março de 2013
Ano 8 N.32 

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  • ENSAIO TEMÁTICO
  • Cinema silencioso no acervo do AHSP

    contribuição para a história da tecnologia de projeção
    da imagem em movimento




    | A legislação como fonte | A projeção | Os manuais | Por fim, os depósitos | Fontes |



    Por fim, os depósitos

    Contribuição pontual a uma história da tecnologia do cinema pode ser detectada no acervo AHSP nos primeiros projetos para depósitos de filmes cinematográficos. A menção à existência de armazenamento de fitas, utilizando um termo de época, é evidenciada nos processos de licenciamentos de salas de exibição e nos pareceres de fiscalização.

    Ali ficam claros o caráter irregular e a improvisação, pondo em risco espectadores e funcionários. Basta ver como a legislação apresentada anteriormente proibe terminantemente essa prática. No entanto, é no âmbito do controle do comércio de explosivos e inflamáveis que surgirá regulamentação específica para os depósitos de filmes que as empresas de distribuição cinematográfica são obrigadas a manter.

    Será na capital do Estado, em especial por suas conexões ferroviárias para o interior, que esses empreendimentos se estabelecem. E as dimensões devem atender as exigências geradas pela demanda do imenso território a ser abastecido.

    A primeira legislação municipal sobre o tema data de 1918, regulamentando o comércio de explosivos e inflamáveis. Não ocorre ai nenhuma menção ao setor cinematográfico. O período corresponde à expansão na capital do comércio de combustível para a frota automobilística. O "Padrão Municipal" para edificações, definido pela lei nº 2.332, em 1920, mantém o mesmo procedimento não abordando o tema. Apenas em fevereiro de 1931, o ato nº 100, "regula o comércio de inflamáveis e explosivos e o funcionamento de fábricas de explosivo e dá outras providências”.

    Essa legislação, aprovada na administração Luiz de Anhaia Mello, traz ordenamentos expressos e, afora os setores específicos, é o único segmento conexo objeto de detalhamento. É esse o foco dos artigos 36 a 41, que definem parâmetros, regulando dimensionamento e operações:
      Dos inflamáveis sólidos
      Fitas cinematográficas

      Art.36.º – É proibido armazenar, guarda ou manipular fitas cinematográficas em quantidades superiores a 10 bobinas ou rolos de 100 metros por unidade, sem prévia licença da Prefeitura Municipal.

      Art. 37.º – Até ao máximo de 200 bobinas ou rolos de 400 metros por unidade ou até ao peso máximo de 500 kgs, os depósitos de – fitas cinematográficas – obedecerão às seguintes disposições:

        I – O armário, cofre ou móvel onde estiverem guardadas ou armazenadas as fitas cinematográficas, será dividido em células ou compartimentos contendo, por unidade, o máximo de 50 bobinas ou rolos, perfazendo o comprimento total de 20.000 metros ou o peso total de 125 kgs.

        II – O volume máximo de cada célula ou compartimento será de 1m3 e o volume mínimo de 3 decímetros cúbicos por kg. de fita armazenada.

        III – A célula ou compartimento será feita de material resistente, e bom isolador do calor.

        IV – Toda célula ou compartimento será provido, em uma de suas faces, de uma porta independente, de material bom isolador, do calor.
        (sic)

        V – A célula ou compartimento será provido de um pulverizador, funcionando automaticamente, em caso de incêndio, de sensibilidade, e de modelo aprovado pela Diretoria de Obras e Viação.

        VI – As fitas armazenadas serão mantidas na posição vertical.

      Art.38.º – Para quantidades superiores a 200 bobinas ou rolos de 400 metros por unidade ou ao peso líquido de 500 kgs., os depósitos obedecerão às seguintes disposições:

        I – As bobinas ou rolos de fitas cinematográficas serão mantidos em câmaras ou cofres apropriados, resistentes, de material bom isolador do calor, de modelo aceito pela Diretoria de Obras e Viação.

        II – A lotação máxima da câmara ou cofre será de 200 bobinas ou rolos de 400 metros por unidade ou de 500 kgs. de peso líquido.

        III – O volume máximo da câmara ou cofre será de 20 metros cúbicos.

        IV – Todo cofre será provido de um condutor destinado ao escape dos gazes que se produzirem por ocasião de eventual explosão, tendo 1 metro quadrado de seção reta, no mínimo, dando diretamente para o ar livre, e a 2 metros pelo menos de qualquer saída de socorro.

        V – O condutor referido no parágrafo precedente será feito de material sólido, bom isolador do calor, aceito pela Diretoria de Obras e Viação.

        VI – Em tal condutor, a extremidade dando para o ar exterior,
        (sic) será vedada por uma espécie de janela de uma só folha, feita de material leve e bom isolador do calor. Este sistema de vedação deverá funcionar automaticamente em caso de incêndio e nenhum painel constitutivo terá uma área inferior a 30 decímetros quadrados.

        VII – Na referida extremidade e do lado de dentro, haverá igualmente uma rede fixa de arame forte, com malhas de 10 cms, no mínimo, de lado, e disposta de maneira a não prejudicar o funcionamento da janela referida no parágrafo precedente.

        VIII – Em cada câmara ou cofre de fitas cinematográficas, haverá um pulverizador automático de capacidade e modelo aprovado pela Diretoria de Obras e Viação.

        IX – As bobinas ou rolos de fitas serão colocadas verticalmente em prateleiras ou sub-divisões internas feitas de material resistente bom isolador do calor.

        X – As aberturas de portas, em depósitos desta ordem, serão providas de duplas portas. A porta interna será automática. A porta externa poderá ser fechada automaticamente em caso de incêndio e será construída de forma a impedir a passagem das chamas.

      Art. 39.º – Em qualquer depósito de fitas cinematográficas é proibido fumar, acender lume e, de maneira geral, ter qualquer fonte de calor capaz de produzir incêndio.

      Art.40.º – A iluminação artificial permitida será exclusivamente a iluminação por lâmpadas elétricas incandescentes, sendo proibido o uso de lâmpadas elétricas com cordões extensivos.

      Art.41.º – Os motores elétricos instalados em qualquer depósito serão de boa construção e não deverão produzir faísca de espécie alguma.

    O ato define por fim multas e procedimento em casos de reincidências, com eventual cassação de licença de funcionamento, estabelecendo um prazo de um ano para adequação dos depósitos existentes sob pena de remoção ou fechamento. Seria oportuno apontar que a especificidade do tema e as questões de segurança implicada justificam o ato dedicado ao tema, no entanto, o Código de Obras 'Arthur Saboya', objeto da lei nº 3.427, de 1929, bem como sua consolidação, feita através do ato nº 663, em 1934, não trazem qualquer referência à questão, seja nos artigos relativos a casas de diversões (477 a 528) ou a inflamáveis e explosivos (628 a 721).


    A resposta ao texto legal pode ser identificada na documentação remanescente. Não como protesto, mas através de projetos para construção de depósitos especializados. Talvez a consciência civil sobre os aspectos de segurança e as penalidades previstas agora tenham sido motivadoras.

    O sistema proposto pela regulamentação é simples. O depósito é composto por um conjunto de pequenos cofres com portas, que em caso de incêndio são fechadas automaticamente, associado a uma sistema de exaustão que abre automaticamente para vazão dos gases.


    Em outubro de 1931, seis meses após a edição da regulamentação (ato nº 100), consta processo relativo aos cofres para filme da Paramount Films S/A (local não indicado), representada pelo gerente Pedro Soares Germano, no qual o engenheiro Amleto Nipote requer visto de funcionamento de dois cofres, atendendo intimação com exigências apresentadas pela fiscalização (processo nº 49.184/31). Infelizmente, a prancha com o projeto foi retirada do processo.


    No início de 1932, a Metro Goldwyn Mayer do Brasil apresenta pedido pedido de vistoria para depósito de filmes. A prancha inclusa (processo 01.256/32), datada de 4 de janeiro de 1932, é assinada pelo engenheiro [Homero] de Almeida, da qual alguns detalhes (planta e corte transversal) são reproduzidos abaixo.

    ISSN: 1981-0954



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    *Roteiro para leitura
    Teatro Paraiso, anúncio do projetor, 1924
    Depósito de filmes da empresa MGM do Brasil, Largo de Santa Efigênia. Ano 1932.
    Detalhe da prancha, aqui representada em preto e branco para melhor visualização,
    com planta do conjunto, vendo-se a série de cofres de armazenamento.

    Acervo AHSP


    Teatro Paraiso, anúncio do projetor, 1924

    Outro detalhe da mesma prancha, apresenta corte transversal do depósito,
    o que permite visualizar o sistema de exaustão.

    Acervo AHSP

    O depósito de filmes da Metro será construído no edifício ocupado pelo cinema Paratodos, junto ao Largo de Santa Efigênia, a uma quadra do grande polo de salas ao redor de trecho da Avenida São João. O edifício arrendado pela Empresa Cine Brasil Ltda, responsável pela sala, abriga o depósito em área sublocada pelo exibidor. Esse aspecto é visível na planta, vendo-se à esquerda a parede contígua à sala.

    Conforme processo 44.016/33, em setembro a empresa fora intimada pela prefeitura a fechar o cofre por não cumprimento das exigências. Foi realizado no local, com a presença de engenheiro da prefeitura, teste para avaliação do sistema automático para fechamento das cabines. Para isso foi avaliada a liga metálica empregada que deveria derreter com o calor do foco de incêndio inicial, disparando o sistema de fechamento das portas individuais de cada cofre. Apenas em janeiro de 1934 é dado encaminhamento ao alvará.
    (processos 10.271/32, 01.256/32, 06.751/33, 44.016/33, 16.249/32)

    Em agosto de 1933, os Irmãos Campanille apresentam projeto para o depósito da unidade do grupo Matarazzo que atua também como distribuidor cinematográfico. Proprietários do imóvel, à Rua Vitoria nº 24, apresentam prancha e memorial descritivo. O projeto do depósito, que inclui sistema de combate à incêncio com pulverização automática, inclui duas salas, uma com 9 cofres, outra com 6, trazendo ainda detalhamento do mecanismo de contrapeso para fechamento automático dos cofres. Como consta do processo 39.480, os interessados desistem da obra em fevereiro de 1934.
    (processos 39.480/33, 36.621/34)


    Episódio pontual, essas propostas e legislação específica constituem o primeiro registro do gênero. Em conjunto com o panorama sobre sistema de projeção permitem constituir bases sólidas para novas colaborações sobre a história da tecnologia do cinema no Brasil.


    Ricardo Mendes

    Núcleo de Pesquisa Editorial
    SPD / SMC / PMSP



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    Para citação adote:

    MENDES, Ricardo. Cinema silencioso no acervo do AHSP:
    contribuição para a história da tecnologia de projeção da imagem em movimento.
    INFORMATIVO ARQUIVO HISTÓRICO DE SÃO PAULO, 8 (32): mar.2013
    <http://www.arquivohistorico.sp.gov.br>

     
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