PMSP/SMC/DPH
São Paulo, outubro de 2010
Ano 5 N.27 

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  • ESTUDOS & PESQUISAS
  • Pequena contribuição para o estudo da indumentária dos primeiros paulistanos


    Eudes Campos
    Seção de Estudos e Pesquisas




    | Introdução | Os trajes quinhentistas... | A evolução dos trajes... | Glossário | Fontes |


    Os trajes quinhentistas de São Paulo de Piratininga


    Não resistimos em traçar um paralelo entre os trajes usados pelo poviléu lisboeta representado no quadro acima analisado e os dos paulistanos do tempo de Cardim. Embora esse autor chame atenção para os detalhes que diferenciavam a indumentária paulistana das de outros portugueses (pelotes de algodão, petrinas, roupões e bernéus de cacheira), julgamos que no mais a maneira de vestir do piratiningano não se afastava do traje popular envergado pelos lusitanos.

    Por exemplo, os portugueses quinhentistas de São Paulo deviam vestir as mesmas peças de roupa básicas vistas cobrindo os escravos de Lisboa: camisa, ceroulas, gibão, ao qual eram atadas as calças justas de tecido, providas de braguilhas (fig.11A). Afinal, esse era o traje padrão usado pelo homem europeu do povo, tantas vezes pintado por Pieter Brueghel, o Velho (c. 1525-1569), por exemplo, na Flandres do século XVI, e ainda registrado nessa região em pleno século seguinte por outros pintores flamengos de tendência realista (fig.12).

    Com relação às primeiras mulheres portuguesas moradoras em São Paulo, deveriam elas se vestir da mesma maneira que as escravas vistas na Capital da Metrópole, sem tirar nem pôr (fig.11E). Talvez em Piratininga o uso do sapato fosse ainda menos frequente do que em Portugal, país em que, como é sabido, as pessoas mais desfavorecidas do povo, até meados do século XX, ainda andavam sem sapatos (fig. 52B). No planalto paulista, o contato com a cultura indígena deve sem dúvida ter reforçado essa tradição do campônio português. E não eram só campônios que andavam descalços no Brasil, o Padre José de Anchieta (1534-1597) garantiu que também “os mui ricos e honrados da terra” o faziam, pois esse era “o uso da terra” (ANCHIETA, p.426 e 427). O historiador Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), aliás, discorreu magistralmente sobre esse aspecto da cultura mameluca paulista em sua obra Caminhos e fronteiras (1957), chamando a atenção para o fato de que até os jesuítas dos primeiros tempos preferiam andar descalços, o que também era dito com todas as letras pelo padre jesuíta acima mencionado.

    Em São Paulo, no princípio, é óbvio que nem todas as pessoas se vestiam à portuguesa. Os indígenas e os mamelucos, filhos de mães índias, simplesmente não se cobriam. É conhecida a passagem de carta do Padre Manuel da Nóbrega (1517-1570), de 1555, em que acusa João Ramalho (c.1493-1580) e seus inúmeros filhos de andarem despidos e levarem vida de índios (LEITE, v.1, p.498). Quando se viram forçados a se vestir, os indígenas e os mamelucos adotaram algumas poucas peças do traje ocidental. Do mesmo modo que José de Anchieta já testemunhara, o capuchinho francês Charles D’Abbeville (séc. XVI-1632) viu no Maranhão de 1612 índios usando roupas européias sem nenhum compromisso. Ora punham apenas um chapéu, ora outra peça de roupa. Eram capazes de envergar as vestes ocidentais completas por algum tempo, mas no dia seguinte voltavam a andar inteiramente nus (ABBEVILLE, p. 220 e 221). A primeira peça de roupa que os indígenas recebiam dos padres da Companhia era uma camisa, depois de haverem sido batizados. Segundo queixas dos jesuítas, muitos se deixavam batizar para só receber camisas (LEITE, v.1, p.386). Sabe-se também que os jesuítas de São Paulo, certa feita, mandaram confeccionar camisas com as lonas gastas das velas dos navios para cobrir a nudez de seus indinhos. Na verdade, grande parte dos homens pobres contentava-se em viver com simples roupas de baixo feitas de algodão, camisa de fraldas soltas e ceroulas, largas e curtas, sempre as mesmas até se transformarem em frangalhos. E nunca usavam nem meias nem sapatos, andando sempre de pernas nuas e pés descalços. Em inventários e testamentos seiscentistas achamos por vezes essa situação: famílias paulistas que produziam algodão de maneira doméstica só tinham como peças de roupa camisas e ceroulas (LIMA, p.132 e 133). Estas afinal eram as roupas típicas do camponês europeu medieval, quando trabalhava no campo durante os dias quentes de verão (fig.13A). No Brasil, em razão do clima ameno do País, foi o traje que coube ao tropeiro, ao escravo negro e ao índio aculturado e ao branco pobre até meados do século XIX, suficientemente documentada por meio das descrições dos viajantes e da arte dos pintores e desenhistas estrangeiros que então nos visitavam (fig.13B). O pintor neerlandês Albert Eckhout (1610-1666), no Nordeste dos anos de 1630, pintou um índio tupi usando apenas um par de ceroulas (fig.14) e um garboso mulato, que à sua única peça de roupa, uma bela camisa, havia sobreposto uma roupeta (fig.15).

    Como agasalho em São Paulo seria adotado o poncho (fig.16). Este último, tornar-se-ia uma peça de vestimenta característica dos tropeiros paulistas nos séculos vindouros (séc. XVIII e XIX), e formalmente talvez fosse herdeiro tanto do bernéu europeu usado aqui no século XVI, quanto do punchu, abrigo de lã usado por certos grupos indígenas da América do Sul, habitantes da região central dos Andes (área correspondente aos países atuais: Peru, Bolívia e Equador). Como já se afirmou muitas vezes, a região andina e a vila de São Paulo mantiveram certa ligação durante o período da União Ibérica (1580-1640), em razão dos sertanistas paulistas estarem sempre a percorrer os vários ramais da trilha intercontinental do Peabiru em busca de metais preciosos e índios para escravização.

    Por seu lado, as índias aculturadas costumavam usar, de início, apenas um pedaço de pano enrolado na cintura; a seguir, passaram a andar apenas em camisa, vestimenta feita de bretanha, segundo depoimentos de época, da mesma maneira como a mameluca do Nordeste retratada por Eckhout (figs.17 e 18) . A diferença entre as índias verdadeiras e a mestiça pintada pelo holandês residiria no fato de que, para maior efeito estético, a mameluca foi representada envergando uma amplíssima camisa feita de tecido superior, com um largo cabeção rendado, só acessível às mulheres das camadas superiores da sociedade de então, quem sabe alguma prenda oferecida por um senhor seduzido pelo encanto da cativa. Depois, à camisa se juntou a saia, e assim permaneceram as índias até o século retrasado, de saia e camisa, da mesma maneira que as escravas negras da época se vestiam. Enquanto isso, a maioria das crianças pobres andava completamente nua até pelo menos o final da primeira infância.

    Não nos devemos esquecer, porém, das ilustres descendentes de Bartira (c.1493-1580), que, casadas com reinóis, iam aos domingos à missa com trajes quase iguais ao usado pela famosa índia norte-americana Pocahontas (1595-1617), no período que viveu na Inglaterra. O traje inglês do início do século XVII ainda sofria certa influência hispânica, que logo perderia, e ao contemplarmos o retrato de Pocahontas, estamos vendo algo não muito distante da imagem das mamelucas paulistas socialmente integradas, em dia de festa (figs.19) . O que as distinguia basicamente era que as inglesas seiscentistas, além de ignorar o uso do manto medieval, ciosamente conservado pela tradição ibérica, portavam uma desgraciosa saia em forma de tambor (drum or wheel farthigale) que as portuguesas e brasileiras jamais conheceram, e como acessório elegante se faziam acompanhar de um abano, que no caso de Pocahontas era constituído de apenas três longas plumas, objeto sem dúvida nenhuma desconhecido no Brasil.

    Entre os portugueses, era simplesmente irrefreável a necessidade de ostentar luxo na recém-conquistada terra do Brasil. Os que se aventuravam na colônia estavam dispostos a correr riscos incalculáveis para poder alcançar uma nova condição de vida. Em Portugal, a sociedade monárquica já estava desde muito consolidada e tinha caráter fundamentalmente estamental. Na Metrópole a ascensão social era algo muitíssimo mais difícil de atingir que o mero enriquecimento. Na colônia, ao contrário, amplas eram as possibilidades. Ser senhor de terras e escravos abria as portas para o rápido enriquecimento. E o luxo, quando exteriorizado com grandeza senão com estardalhaço, enobrecia o novo-rico.

    José de Anchieta fez a seguinte reflexão a respeito da fácil mobilidade social oferecida pela nascente sociedade brasileira nas regiões produtoras de açúcar e os muitos males que advinham dessa mobilidade:
      Os homens e mulheres portugueses, nesta terra se vestem limpamente de todas as sedas, veludos, damascos, razes [ver glossário no fim deste trabalho] e mais panos finos como em Portugal, e nisto se tratam com fausto, maximè as mulheres, que vestem muitas sedas e joias e creio que levam nisto vantagem, por não serem tão nobres, às de Portugal e todos, assim homens como mulheres como aqui vêm se fazem senhores e reis por terem muitos escravos e fazendas de assucar por onde reina o ocio e lascivia e o vício da murmuração geralmente. [grifo nosso] (ANCHIETA, p.426.)
    A procura pelo luxo era geral, pois o luxo distinguia tradicionalmente, à primeira vista, o nobre do plebeu. Sob novas circunstâncias de vida, na Colônia até os peões se achavam no direito de usar tecidos caros, que na Metrópole por meio de leis suntuárias lhes eram interditos. Falando dos moradores da Bahia, disse o português Gabriel Soares de Sousa (1540-1591):
      Tratam suas pessoas mui honradamente, com muitos cavalos, criados e escravos, e com vestidos demasiados, especialmente as mulheres, porque não vestem senão sedas, por a terra não ser fria, no que fazem grandes despezas, mòrmente entre a gente de menor condição; porque qualquer peão anda com calções e gibão de setim ou damasco, e trazem as mulheres com vasquinhas e gibões do mesmo, os quais, como tem possibilidade, têm suas casas mui bem concertadas e na sua mesa serviço de prata, e trazem suas mulheres mui bem ataviadas de jóias de ouro. [grifo nosso] (Apud. ANCHIETA, nota 604)

    São Paulo, porém, não era o Nordeste. Aqui não existiam as extensas e altamente lucrativas culturas de cana de açúcar. Para fazer fortuna era necessário encontrar jazidas de metais preciosos ou efetuar apresamentos de índios para o trabalho escravo nas incipientes lavouras paulistas ou para revenda. No século XVI não havia na Capitania de São Vicente pessoas possuidoras de extensos cabedais, nem as condições eram fáceis. Mesmo assim a busca frenética por uma posição social mais vantajosa era, sem dúvida, a preocupação de todos.

    A função social dos “vestidos de respeito”, como eram chamado os trajes domingueiros, era justamente essa: denotar o status daquele que os envergava. Quanto mais luxuosos fossem eles, quanto mais jóias pudessem adorná-los, mais elevada a condição social da pessoa que os ostentava. Muitas vezes a nova posição era bem distante da que o possuidor detinha em sua terra de origem. Aqui as regulamentações suntuárias portuguesas não chegaram a viger e isso era uma vantagem em que José de Anchieta já havia reparado. Com o tempo, denotar status através da indumentária ficaria sendo um traço típico de paulistas. Na época do Morgado de Mateus (1722-1798), o governador da capitania paulista entre 1765 e 1775 repararia que os paulistanos abastados moravam muito mal, em casas sem nenhum conforto, mas faziam questão de vestir-se de modo muito superior aos seus recursos, com o melhor linho, a melhor holanda e o melhor veludo (apud. CAMPOS, p.193). Podemos supor que em casa os paulistas, como então muitos outros brasileiros, estavam acostumados a ficar à vontade, mal trajados ou até em trajes menores, só se compondo com esmero em ocasiões especiais, durante as festas na vila. O que o mineralogista inglês John Mawe (1764-1829) disse a respeito dos homens da Zona de Mineração no início do século XIX poderia muito bem, provavelmente, ser atribuído aos paulistas do seiscentismo:
      quando saem [ ...] mostram toda a sua magnificência, diferindo sua 'toilette' da roupa doméstica, tanto quanto difere a borboleta faustosa do modesto casulo da crisálida.(MAWE, p. 240)
    Neste contexto não nos espanta que a Câmara paulistana tenha aprovado em 1587 o regimento dos alfaiates, tabelando os preços da confecção de certas peças de vestuário, masculinas e femininas. Provavelmente assim agiu na defesa dos interesses de uma parcela restrita da população que poderia vir a ser escandalosamente explorada por profissionais muito requisitados. Grande parte, porém, da sociedade piratiningana não estava em condições de recorrer a um profissional para a confecção de peças de roupa, sobretudo quando, em casa, as mulheres da família, em geral no comando de escravas, tinham como uma das tarefas domésticas habituais fiar, tecer e costurar panos de algodão (LIMA, p.122 e ss.).



    O regimento dos alfaiates de 1587 (ATAS ,v.1, p. 324)

    As peças de vestuário cuja confecção foi tabelada por ordem da Câmara da vila de São Paulo em 1587 são as seguintes:

    Roupeta

    Ropilla em espanhol. Era uma vestimenta masculina adotada em Espanha por volta de 1550. Muito ajustada, com abas meio longas, era usada sobre o gibão (BOUCHER, p.441). Apresentava mangas soltas e pendentes e ombreiras em forma de meia-lua, estofadas, que decoravam a parte superior das cavas (idem, p.228).

    Provavelmente a roupeta portuguesa tinha forma idêntica, tendo sido introduzida provavelmente no país, graças ao prestígio das modas espanholas durante o quinhentismo, prestígio que só aumentou em Portugal com sua união política com o país vizinho a partir de 1580. É possível também que pelote e roupeta tenham com tempo se confundido, pois na centúria seguinte só o termo roupeta sobreviveria (fig. 20).

    Segundo o regimento dos alfaiates paulistanos, a roupeta de algodão aberta por diante com seus botões, chã (ou seja, simples) custava 100 reis. Feitas de pano do Reino com seus botões, 150.


    Calções abigarrados; calções chãos

    Os calções eram peças do vestuário masculino usadas pelas camadas superiores do século XVI. Na Europa, os pobres e camponeses certamente não os adotavam. Os calções substituíam a parte superior das calças ajustadas, feitas de tecido, usadas pelas camadas altas da sociedade no século anterior, enquanto a parte inferior das calças foi trocada pelas meias-calças.

    Estas últimas peças, depois chamadas meias, passaram a ser feitas de malha, modelando melhor as pernas do que as antigas calças de pano, por isso aparecem nos inventários da época como meias de retrós (linha de seda), ou de agulha, já que eram executadas à mão com esse instrumento de aço. Havia dois tipo de meias, as com pés e as de cabrestilho, estas não envolviam os pés, só rodeando-os com a alça que mantinha a meia esticada. Com este último modelo, calçavam-se escarpins, que eram ligeiras sapatilhas de tecido fino, de linho ou algodão (lençaria), ou de ponto meia, enfiadas antes das meias e dos calçados (fig. 21).

    O termo abigarrado vinha do francês (bigarré), via língua espanhola, cujo sentido mais preciso talvez fosse “formado de elementos disparatados” (e não “multicoloridos”, outra acepção da palavra). Os calções feitos com elementos disparatados seriam aqueles cheios de detalhes decorativos, recortes, frisados, e sobretudo talhos ou fendas (também chamados golpes), que exibiam o pano do forro.

    Em meados do XVI, entraram em moda calções arredondados, bufantes à custa de muito estofo, feitos de rocas, tiras estreitas e compridas de tecido encorpado, dispostas na perpendicular, de modo a deixar entrever pelas frestas a fazenda fina do forro que envolvia o enchimento. Nos anos de 1580, esse modelo era prolongado por peças de tecido de formato tubular, comumente feitas de tafetá, que recobriam as coxas até os joelhos (canons, em francês). Os calções dessa época comportavam ainda a braguilha, mais tarde desaparecida. Era uma peça feita de tecido, fortemente estruturada com recheio, que se destacava dos calções de forma agressiva, tendo adquirido com o tempo uma forma nitidamente itifálica (fig. 22). Supomos que calções acolchoados do tipo aqui descrito tenham sido raríssimos em São Paulo na época em que foi baixado o regimento que estamos analisando.

    Quando feitos de algodão, os calções custariam 160 reis, quando de pano do Reino, 100, e quando guarnecidos [de galões ?], 140. Os calções chãos, isto é, comuns ou simples, sairiam por apenas 40 réis.

    O curioso é que a peça se feita de algodão, tecido barato de produção local, saía muito mais cara do que se executada com pano importado e enriquecida com guarnições. Talvez porque o tecido de algodão não se prestasse à boa execução dessas peças complicadas ou o material dificultasse muito a sua confecção.


    Gibão com seus botões

    O gibão, ou antes jubão, como era então conhecido, era a peça de roupa que os homens vestiam diretamente sobre a camisa. Na época do regimento dos alfaiates, a peça usada pelas camadas superiores era inteiramente fechada na frente por botões, prolongando-se até o alto do pescoço. Era enchumaçada de modo a modelar o busto masculino. Em geral, apresentava uma deselegante curvatura saliente na região abdominal, imitando um ventre proeminente. Essa saliência era influenciada pelo modelo das couraças em então em uso, que a adotaram por motivos balísticos, de modo a favorecer o desvio dos projéteis das armas de fogo (BOUCHER, p.438).

    As mangas longas, ajustadas e enfeitadas do gibão ficavam quase sempre visíveis pelas cavas das peças vestidas por cima, roupeta ou pelote, porque essas duas vestimentas externas ou não tinham mangas ou as tinham perdidas. Não sendo feitas para serem vestidas, as mangas perdidas ficavam soltas e pendentes ao longo da parte posterior dos braços.

    O gibão era uma peça interior, raramente usada sem outras vestimentas por cima. De acordo com o regimento dos alfaiates paulistanos, devia custar 100 réis; se forrado 6 vinténs (120 réis).


    Saio de pano de algodão chão

    Saio (português), sayo (espanhol) ou saye/sayon (francês). Trata-se aqui, certamente, de uma peça do vestuário masculino No século XVI, o saio era um casaco largo, cujas abas podiam ser longas. Tinha aletas nos ombros ou mangas pendentes. Abotoado na frente, era usado com ou sem cintura. Era mais especialmente a vestimenta dos pagens, segundo François Boucher (p. 441). Aparece claramente no quadro de Diego Velásquez intitulado O vendedor de água de Sevilha (1623) (fig. 23). De acordo com o Novo Diccionario da Língua Portugueza (1806), saio era uma “espécie de roupa larga, ou casacão de que se usava antigamente”. Segundo o regimento dos alfaiates, o saio custava 80 réis; se debruado 100.


    Basquinha

    Basquiña, era assim que se chamava na Espanha a saia exterior que as mulheres das camadas superiores usavam para sair à rua (Diccionario de la lengua española de la Real Academia de España) .

    Em Portugal, a exemplo do país vizinho, as mulheres ricas usavam a basquinha, ou vasquinha, sobre uma rígida armação em forma de sino, feita de círculos de madeira ou ferro (verdugo), de origem espanhola (fig. 24) . No século seguinte o verdugo foi substituído pelo guardainfante. Tal moda certamente nunca chegou a São Paulo. Aqui talvez se usasse a saia externa, bem pregueada, sobre várias saias internas ou anáguas para alcançar o volume exigido pelo gosto. A ficha n.º 27724 do AESB traz, sobre esse assunto, uma informação preciosa, que passou despercebida para todos os pesquisadores que se interessaram pelos trajes paulistas do tempo da Colônia. No inventário de Gaspar Cubas (1648) lê-se entre várias peças do guarda-roupa feminino: Meias anáguas com seu chouriço, sendo esse chouriço provavelmente um saco em forma de rolo, feito de tecido e com enchimento, que costurado na altura da cintura da anágua servia para entufar as saias. Algo parecido o com vertugadin à la française, também chamado bourrelet (BOUCHER, p. 221, legenda fig. 437).

    Frequentemente a basquinha formava conjunto com a saia de baixo, ou então contrastava em cor e textura com ela. Era considerado elegante que a mulher deixasse ver a saia de baixo, peça que podia ser quase tão rica e atraente quanto a saia externa.

    Se a basquinha fosse de pano do Reino, valeria 100 réis; se guarnecida, 150.


    Gibão de seda pespontado com suas bainhas pespontadas com seus botões

    Peça feminina (jupon, em espanhol) correspondente ao gibão masculino (BOUCHER, p.227, 228 e 435), mas, é óbvio, sem os enchimentos que lhe davam a forma de couraça (fig. 25). Usada sobre a camisa e embaixo do corpinho. Seu preço era 150 réis.


    Corpinho de mulher

    Cuerpo baxo, em espanhol. Parte superior da indumentária feminina, de aparência rígida e corte ajustado. Sem mangas próprias, cobria do pescoço até a cintura durante o século XVI.

    A peça em geral era fortemente guarnecida com barbatanas para dar forma extremamente afunilada ao torso da mulher, comprimia os seios e era encompridado na frente, acabando numa ponta desgraciosa (fig. 24) . Verdadeiro espartilho, era por vezes usado como vestimenta exterior, com mangas falsas aplicadas nas cavas e combinando com a ampla basquinha. No inventário de Isabel Fernandes, de 1619 (AESB), encontramos um traje desse tipo: corpinho de cetim escuro espartilhado.

    O preço de confecção dado ao corpinho pelo regimento dos alfaiates era de 70 réis. Muito baixo, em nossa opinião, para a execução de uma vestimenta espartilhada, o que indica que, neste caso, a peça talvez estivesse destituída de estrutura.


    Saio de um manto

    Ao que parece, era uma vestidura confeccionada de início com o tecido do manto, que poderia ser tanto o entrançado de lã denominado sarja, quanto uma espécie de seda fina chamada burato.

    O manto era uma peça de cor negra ou azul escuro usada para cobrir a figura feminina, e que no dizer de Frei Vicente do Salvador era, no início do século XVII, rara em São Paulo, sendo por isso geralmente emprestada à noiva para que pudesse ir à cerimônia de seu casamento. De acordo com inventários paulistas, o saio em São Paulo era feito preferentemente de baeta, como aparece em inventário de Paula Fernandes, de 1614 (AESB).

    Em Portugal, há documentos que falam em mantão, que devia ser, como o nome diz, uma grande peça de lã que cobria a mulher toda, embuçando-a completamente. O pintor italiano Cesare Vecellio (c.1530-c.1601) mostra-nos espanholas andando desse jeito pelas ruas (figs. 249, 251 e 253). A mulher solteira (fig. 252), por exemplo, apesar de trazer sobre si uma peça de tamanho menor, que deixa visível a parte inferior do vestido, tem o rosto inteiramente oculto pela peça de lã, restando apenas uma dobra ou fresta para o olho esquerdo (figs. 26 e 27).

    É também muito conhecido o afresco de autoria de Giotto di Bondone (c.1267-1337), denominado Beijo no Portão Dourado (Capela Arena, em Pádua, 1305-1306), em que aparece uma figura desse tipo (fig. 28) . Curioso e importante exemplar de arte italiana que documenta o costume medieval de embuçamento da mulher europeia numa região bastante afastada da zona sob influência direta da civilização muçulmana.

    A portuguesa que se observa em livro de Vecellio (fig. 263), porém, traz uma peça que a cobre, na frente, pouco mais que os seus ombros e rosto. Na cabeça, sobre a peça, usa um pequeno chapéu inclinado para frente, de modo a esconder a parte superior do rosto, como as paulistas o farão até o século XIX. Pela aparência da peça que a envolvia, podemos supor que o manto da portuguesa estivesse dobrado pela metade (fig. 29) .

    A forma original do mantão parece ter sido uma grande semicircunferência de tecido de lã. Embora muito usado pelas mulheres das camadas médias portuguesas, o manto sofreria restrições no século seguinte. As grandes damas espanholas e portuguesas substituíram-no pela mantilha, graciosa e transparente, com rendas nas bordas, à toda volta. Enquanto isso, em Portugal, os rebuços foram proibidos por meio de alvarás, por razões de segurança, em 1626 e em 1649, ficando as mulheres obrigadas a andar com o rosto descoberto. No Brasil, porém, nada aconteceu.

    No século XVII, os mantos começaram a ser feitos de tafetá de seda (inventário de Maria Ribeiro, 1629; AESB) e no inventário de Cornélio de Arzão, datado de 1638, encontra-se a primeira menção a manto de tafetá com suas rendas (AESB), rendas chamadas de pontas (inventário de Gaspar de Cubas, 1648; AESB), moda que permaneceria até o século XIX, sendo registrada pelo pintor francês Aimé-Adrien Taunay (1803-1828) em São Paulo em 1825 (fig.30A e 30B).

    No século XVIII, em São Paulo, o governador Lobo de Saldanha implicou-se com o fato de as paulistanas não acatarem o alvará régio de 1649. Entendia que o rebuço favorecia a falta de recato das paulistas, muitas das quais acostumadas a entrar anônimas, durante o dia, em casa de homem, além de incentivar o crime, uma vez que homens se travestiam com o manto feminino para cometer delitos. Por meio de um bando, Lobo de Saldanha proibiu o manto e o chapéu das paulistas em 1777. Em 1810, o Príncipe Regente, atendendo uma solicitação do governador Franca e Horta, voltou a proibi-los, mas, de novo, sem grandes resultados (ver: <http://www.arquiamigos.org.br/info/info17/i-manu.htm>). Seria, afinal, o progresso da cidade, sobretudo a partir dos anos de 1870, que eliminaria de forma definitiva as moças pobres que ainda teimavam em se esconder sob retalhos de baeta.

    Já o saio aqui referido era uma espécie de casaco que se punha sobre o vestido; comprido, descia até os calcanhares.

    Na Espanha do século XVI, a peça chamava-se ropa. Aberta na frente do pescoço aos pés e não ajustada na cintura, era confeccionada em tecido grosso, de cor escura, em geral preto. Tinha gola alta e mangas longas, sendo essas mangas bufantes na parte superior. Em geral era decorada com alamares de ouro, quando pertencente a elementos femininos da nobreza. Disseminou-se por muitos países da Europa durante a metade do século XVI, perdurando por mais tempo na Península Ibérica e na região dos Países Baixos, que estivera sob o domínio espanhol. Segundo François Boucher (p.227), a ropa teria origem oriental, tendo sido introduzida na Europa via Portugal, sendo usada pela rainha Catarina da Áustria (1507-1578) já por volta de 1550 (fig. 31A e 31 B).

    Em Portugal, como dissemos, era conhecida sob o nome de saio, e desse modo é citado em testamentos e inventários paulistas do século XVI e XVII. O dicionário Morais/Bluteau (1789) assim o descreve:
      o saio das mulheres, [era] como a roupa aberta de hoje, mas com a differença de ter mangas perdidas até o colo do braço abertas no sangradouro, e por esta abertura se enfiava o braço não o querendo cobrir com toda a manga; e a cauda do vestido era de quatro quartos, ou por mais enfeite de 2 sómente; tinham no cotovelo hum bolso grande.
    Nos inventários paulistas o saio feminino aparece preferentemente feito de baeta, mas outros tecidos caros podiam ser empregados em sua confecção: tafetá aveludado, veludo lavrado, veludo de seda, perpetuana, damasquilho, melcochado, chamalote de seda, etc. (AESB). A vestimenta ficou depois conhecida pelo nome de roupa, segundo Rafael Bluteau (1712-1728), e, no Brasil, de roupão. Na verdade, já em alguns inventários seiscentistas aparece um roupão feminino que deve ser a peça até então conhecida como saio (inventário de Maria Ribeiro, 1629; AESB). Como era peça de ostentação entre as mulheres das camadas superiores, o saio paulista eventualmente trazia adornos que procuravam ecoar essa opulência, principalmente nos seus colchetes de prata sobredourados (inventários de Manuel Fernandes Sardinha, 1633, e de Ângela de Campos e Medina, 1641; AESB).

    No século XIX, o roupão era um longo casaco usado pelas paulistas e visto pelos viajantes da época como uma particularidade feminina de São Paulo, ao lado do manto de sarja ou baeta (fig. 32) . John Mawe assim se referiu à peça:
      [...] um casaco comprido, de lã grossa, enfeitado com veludo, rendas douradas, fustão ou pelúcia, conforme os recursos do possuidor [sic, por possuidora]. Este abrigo é usado como uma espécie de casaco, em casa, em passeios à noite, em viagens, e as senhoras, sempre que o vestem usam chapéus redondos. (MAWE, p.72)
    Em 1809, o roupão foi observado no Rio de Janeiro pelo comerciante inglês John Luccock. Chamou-o então de capote e o definiu como uma espécie de casacão, feito de casimira e enfeitado com adornos de pelúcia. Segundo ele, só gente de condição modesta o usava na época. O botânico francês Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853) também o viu, em 1816, em Barbacena, Minas Gerais (SAINT-HILAIRE, p. 63). As mulheres que estavam na igreja usavam grandes capas sobre os ombros. Eram feitas de tecido pesado e espesso nas cores cor-de-rosa e escarlate, com mangas pendentes e grandes golas. Isso de certo modo é confirmado pelas aquarelas do pintor francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848). Este artista teve a oportunidade de registrar várias vezes a aparência dessa vestimenta, vista na Corte e em outros lugares do Brasil (v.I: pranchas n.24; v. II; n.6 e n. 24). Não fala sobre ela, mas nota-se que era uma peça do vestuário feminino que aos poucos entrava em dessuetude. Aparece sendo usado por uma índia guarani (fig. 67), por uma cigana e por uma mucama (fig. 33). Por influência da moda anglo-portuguesa adotada na corte de D. João VI (1767-1826), o roupão havia passado por uma modernização. Continuava a ser o mesmo casaco confeccionado com lã grossa e pesada, debruada de veludo negro ou pelucia e galões dourados, mas agora trazia nos ombros uma pelerine igualmente enfeitada, a exemplo dos trajes masculinos de origem inglesa (BOUCHER, p. 323).

    Ao que parece, nessa época nunca era vestido, mas apenas sobreposto ao modo de capa. As mangas, aliás, não eram para ser vestidas, pois em alguns exemplares eram mais compridas do que o necessário. Aimé-Adrien Taunay surpreendeu mais uma etapa na modernização desse traje. Em 1825, registrou mulheres e meninas paulistas envergando vastas capas feitas seguramente de tecido inglês (uma delas com estampa em xadrez), com amplas pelerines, substituindo os roupões tradicionais, e no lugar do pequeno chapéu de feltro de tradição ibérica traziam agora na cabeça toucas bufantes ao recente gosto europeu, abundantemente adornadas com plumas (fig. 30B).

    Conforme o estipulado pelo regimento dos alfaiates, o saio de manto valia 100 réis.


    Roupinha ou saia

    Traje infantil do sexo feminino, composto de roupetilha ou roupetinha (corpete) e anáguas (saias). O traje de menina de dez a doze anos saía por 40 réis.


    Carapuça gualteira chã

    Cobertura mole de pano que se ajustava facilmente à cabeça, dada sua forma semiesférica. Provavelmente usada por ambos os sexos. A carapuça, se simples 40 réis; se guarnecida 3 vinténs ou 60 réis.


    Pelote bem acabado com seus botões

    Já discutimos, páginas atrás, acerca da peça externa do vestuário masculino que tinha esse nome. Aqui parece tratar-se da versão feminina do pelote, que como no caso masculino se sobrepunha ao gibão feminino. Seu preço era 150 réis.


    Capote

    “Especie de manto, de que usaõ os homens, comprido até os pes, com cabeção [gola rebatida sobre os ombros]”, segundo o Novo Diccionario da Língua Portugueza, (1806).

    Capa que descia até aos pés, com colarinho (cabeção) e capuz, segundo Fernando Oliveira, autor de O vestuário português dos séculos XV e XVI (http://trajes.no.sapo.pt). Capa larga e longa, com ou sem capuz, segundo o Dicionário Houaiss. Valia 150 réis.


    Roupão de cacheira com pano embaixo

    Certamente trata-se aqui da peça de uso masculino sobre a qual já se falou antes, quando abordamos o roupão de cacheira, mencionado por Fernão Cardim. Como vimos, era peça de vestuário exterior masculino. Segundo o estabelecido pela Câmara de São Paulo, o roupão forrado deveria custar 150 réis.


    Capa de baeta

    A baeta era um tecido de lã ou algodão, de textura felpuda, com pelo em ambas as faces (Houaiss).

    Pelo que vimos atrás a propósito do roupão e bernéu de cacheira, a capa de baeta era considerada a peça mais adequada para ser usadas durante as cerimônias religiosas. Segundo o depoimento de Frei Vicente do Salvador era então rara em São Paulo.

    Conforme Fernando Oliveira (http://trajes.no.sapo.pt/Glossario Vestuario.secXV.XVI.htm) nos informa, a capa de baeta era mais prática e curta do que as outras e o seu preço, estipulado pelo regimento dos alfaiates, deveria ser de 100 réis.


    Capa de pano tosado

    Segundo Alcântara Machado (p. 87), essa capa era feita com raso, tecido de lã sem felpa. Chamava-se assim para se distinguir da peça feita com baeta, que era um tecido felpudo. Saía por 150 réis.



    Regimento dos Sapateiros, 1587 (ATAS, v.1, p. 325)
    Na mesma ocasião em que foi baixado o regimento dos alfaiates, a Câmara da vila de São Paulo estabeleceu o regimento dos sapateiros, tabelando o preço da produção desses artesãos. Por ele conhecemos alguns tipos de calçados à disposição dos fregueses paulistanos:
    • Botas de couro de veado, de porco ou de vaca [?]. Um cruzado, ou seja, 400 réis. Caso o couro fosse dado pelo encomendante, custaria 150 réis e o sapateiro colocaria as solas.
    • Botas do Reino. Custariam 150 réis e o sapateiro poria as solas.
    • Sapatos de duas solas. Sairiam por 120 réis, dando-se o couro 80 réis.
    • Chinelas de couro. Seis vinténs ou 120 réis.
    • Chinelas de cortiça. Dando-se as cortiças, 150 réis. Caso contrário, 200 réis.
    • Sapatos de uma sola. Qualquer couro, quatro vinténs ou 80 réis.
    • Sapatas de mulher. Seis vinténs ou 120 réis.

    Dessa relação, chama-nos a atenção os calçados de sola de cortiça chamados chapins. Eram calçados providos de grossas solas desse material, geralmente revestidas de couro vermelho, que deviam constituir objeto de desejo das vaidosas na época. São definidas da seguinte maneira pelo Novo Diccionario... (1806): “Calçado de mulher; era de quatro, ou cinco solas de sovereiro para fazer mais alta a estatura.”

    A moda italiana dos chapins parece ter surgido em Veneza em fins do século XV, vinda do Oriente – da Turquia mais especificamente, onde as mulheres metiam os pés nus em tamancos muito altos. A partir dessa cidade, disseminou-se pelo resto da Itália. Com relação à Península Ibérica, no entanto, parece que a introdução dos chapins é muito anterior, remontando à Idade Média, por influencia árabe (fig. 34A, 34B e 34C). Os chapins podiam ser usados de duas maneiras: ou a mulher os calçava com os pés enfiados em meias, ou os chapins se faziam acompanhar de botinas feitas com o mesmo acabamento. Calçavam-se primeiro as botinas e em seguida enfiavam-nas nos chapins, como se fossem tamancos flamengos.

    Vecellio mostra-nos mulheres venezianas usando chapins (figs. 110 e 111). A fig.111, de uma prostituta de bordel veneziano, é particularmente notável porque usava chapins muito elevados, com cerca de um palmo de altura. Vemos ainda chapins sendo usados em Vicenza (fig. 158), em Genova (figs.174 e 176), na Toscana (fig. 190), em Ischia (fig. 218). Fora da Itália, vemos na Espanha (figs. 252 e 253), em particular na Galícia e na Navarra (figs. 265 e 267). Sabemos, contudo, que foi moda também em Portugal.

    Como era um tipo de calçado feminino de luxo, caro e nada prático, os chapins devem ter sido reservados para as mais importantes exibições públicas. Na Espanha, foi obrigatório seu uso na corte e depois estiveram associados à cerimônia nupcial (<http://museodeltraje.mcu.es>). Decerto foram muito pouco usados em São Paulo no século XVI, sendo, porém, relativamente fáceis de encontrar em inventários do século seguinte, até mais ou menos 1650. Em inventários de Maria Jorge (1611-1613) e de Paula Fernandes (1614), por exemplo, são citados chapins de Valença.

    Cumpre também tecer aqui alguns comentários a respeito das botas ibéricas, feitas de couro de veado, vaqueta ou couro de porco, usadas, no caso das primeiras, em pleno século XIX em São Paulo, nos arredores de Santa Bárbara de acordo com José de Alencar (1829-1877) no romance Til (1872) (apud. BRUNO, v.5, p.56). Pela iconografia consultada percebe-se que essas botas eram feitas de couro muito macio e extremamente ajustadas, amoldando-se aos contornos dos pés e das pernas. Botas que mantinham uma tradição que vinha do século XV (fig.35A; 35B). Como todos os calçados espanhóis da época, tinham solas estreitas, eram desprovidas de saltos e, no alto, às vezes presilhas as fixavam logo abaixo do joelho – em inventários paulistas fala-se em joelheiras abotoadas (inventário de Bartolomeu de Quadros, 1649). Há pinturas espanholas, no entanto, que mostram modelos seiscentistas provido de um par de tiras de couro que a partir das bordas superiores das botas iam se prender numa cinta apertada em torno da metade da coxa, em ponto oculto pelos calções (fig.36). O objetivo aparente desse sistema era mantê-las esticadas, já que feitas de couro fino e mole. Dizem que os gentilhomens espanhóis dessa época prezavam muito os pés pequenos para homens, chegando a enfaixá-los com muito desconforto (<http://museodeltraje.mcu.es>), daí as formas dos calçados tão ajustadas nos pés. Estimavam igualmente panturrilhas grossas, que ficavam realçadas nas justas botas de couro.

    Na pintura Las Lanzas ou Rendição de Breda, de Diego Velázquez, pintada entre 1634 e 1635 (Museu do Prado), vemos que o vencedor espanhol, general Ambrosio Espinola, usa botas estreitas que vão até os joelhos, de cor clara, podendo ser justamente as famosas botas de couro de veado, enquanto o general derrotado, de origem holandesa, calça o modelo que estava então sendo usado no resto da Europa ocidental, a partir da influência francesa, a bota alta de couro com bocas largas, como um funil (bottes souples en entonnoir). No quadro, em que se representam atos de beligerância recém-concluídos, as partes largas do cano das botas (canhões) do general neerlandês estão levantadas para proteger do constante roçar nas ilhargas dos cavalos as frágeis e caras meias de seda e a parte inferior das roupas, mas em ambientes urbanos eram abaixadas e dobradas à altura das pernas (fig.37). Nesse caso, os homens usavam o que os franceses chamavam de bas à bottes, meias feitas de lençaria que se vestiam por cima das meias de seda para protegê-las do atrito do couro. Essas meias não tinham pé e na parte larga de cima eram guarnecidas de vistosas e largas rendas que revestiam o reverso das botas. Tudo leva a crer que nem esse tipo de botas nem os bas à bottes foram usados em São Paulo, e se o foram, seu uso foi esporádico e efêmero, pois a iconografia posterior só nos deixou registros do modelo hispânico.

    Os artistas que criaram a imagem do bandeirante no inicio do século XX, desconheciam o fato de os espanhóis dos Seiscentos usarem um modelo diferente de botas, que aparece em retratos de cavaleiros, militares e caçadores do primeiro terço do século XVII. Por isso, apoiaram-se numa documentação mais acessível naquele tempo, em geral gravuras francesas, como as de Jacques Callot (1592-1635), intituladas Misérias da Guerra (1633), que ilustram os desastres da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), ou as de Abraham Bosse (1602-1676), com temas galantes e corteses, trazendo a figura do refinado cavalheiro francês dos anos de 1630 e 40, que havia integrado o calçado militar à vestimenta civil, usando-o até mesmo em bailes e em cerimônias realizadas na corte (fig.38).

    Belmonte chegou a desenhar a bota do bandeirante, como um tipo de calçado de couro grosso e pesado, uma versão tosca da bota francesa de corte (fig.39), em nada parecida com as então em uso em São Paulo daquela época. As botas leves e colantes, desprovidas de salto, só começaram a ser substituídas na Espanha pelo modelo francês justamente a partir da década de 1630, aparecendo, por exemplo, no retrato do militar Don Tiburcio de Redin y Cruzat, datado de 1635 (Museu do Prado), pintado pelo Frei Juán Andrés Rizi de Guevara (1600-1681) (fig. 40). Em Portugal, o novo tipo de botas surgiria mais tarde, quando se introduziram as modas masculinas francesas nesse país em consequência da Restauração de 1640. No retrato de D. Teodósio (1634-1653), príncipe do Brasil, herdeiro da coroa portuguesa precocemente falecido, o retratado deixava-se mostrar como homem da moda, usando cabelos longos e botas de feitio francês; trazia ainda rabat de rendas e rhingraves vermelhas adornadas com galões de prata e tufos de fitas nas laterais das bordas inferiores dos calções (como veremos adiante, as rhingraves parecem ter tomado o nome de cuecas em Portugal). Mais tarde, depois de assumir o poder (1662), seu irmão Afonso VI (1643-1683) seria retratado por volta de 1670 vestido de forma semelhante, com botas francesas e tendo substituído o rabat de rendas por um acessório ainda mais recente e elegante, a gravata de rendas atadas com laços de fitas azuis (figs.41 e 42).

    No Brasil, talvez nunca tenha sido usado o tipo de botas que Belmonte e outros artistas atribuíram aos bandeirantes, calçado que, no país de origem, a França, teve seu uso restringido a partir de 1650, voltando a ser usado apenas nas atividades específicas de sempre: para montar a cavalo, nas caçadas e nas guerras. Quando, muito tempo depois, Debret representou um fazendeiro mineiro flagrado num mercado de escravos, o comprador usava botas do velho tipo ibérico, moles e colantes, de couro de veado, tal como usavam os paulistas no primeiro terço do século XVII (DEBRET, v.1, prancha n.23) (fig.43). E os habitantes de São Paulo continuaram a usá-las no século XIX, pois o mesmo artista francês teve o cuidado de figurá-las na representação que fez de um cavaleiro paulista (fig.44). Quanto aos antigos sertanistas do seiscentismo, porém, há indícios de que entrassem na mata, para as suas desbravações, vestidos de modo bastante sumário: de camisas e ceroulas de algodão, bérnios de cacheira ou baeta para se protegerem do frio e... completamente descalços.



    Trajes masculinos portugueses de fins do século XVI

    Temos algumas informações sobre o traje masculino português usado pelas camadas mais altas da sociedade de então. Segundo o documento que descreve o cerimonial adotado na corte para o despertar e o vestir real, denominado Estilo que usava  El-Rei  D. Sebastião ao vestir-se (<http://trajes.no.sapo.pt/Documento9.htm>) , o traje completo do rei, D. Sebastião (1554-1578), compunha-se de: camisa; ceroulas; meias; escarpins; calças (por calções); gibão; botas; roupeta; espada; cinto e chapéu (não sendo mencionada a capa, indispensável para sair). Nas mãos, a etiqueta da época fazia o homem nobre levar um par de luvas perfumadas, seguro na esquerda, e um grande lenço de seda branca (de formato retangular), na direita. Retrato do rei executado por Cristovão de Morais (ativo em Portugal entre 1551 e 1571) e datado de 1565 mostra-o claramente com esse tipo de vestimenta (fig.45A e 45B). Chamamos atenção para o fato de que o rei usava escarpins. De acordo com o que dissemos antes, isso demonstra que as meias que o rei usava dentro das botas eram sem pé, ou seja, de cabrestilho.

    No texto intitulado Estilo que usava o Duque de Bragança ao vestir-se (<http://trajes.no.sapo.pt/Documento10.htm>), é descrito o traje de D.Teodósio I (1510-1563), 5º Duque de Bragança, parente próximo do rei de Portugal. Sua vestimenta é essencialmente a mesma usada por D. Sebastião: camisa, (as ceroulas são omitidas), calças (por calções), jubão (modernamente, gibão), botas (as meias de retrós de seda, feitas à agulha foram omitidas), pelote (ao invés da roupeta), capa, espada, gorra (cobertura de cabeça, flexível, sem aba), luvas e lenço.

    Esses documentos, porém, não fazem menção a uma importante peça que se tornaria característica do período logo a seguir, o mantéu ou cabeção. Tratava-se a princípio de uma volta de folhos de linho fino fortemente engomada, em forma de pregas tubulares, que se punha em redor do pescoço. Desenvolvimento do enfeite discreto que antes se usava contornando o colarinho da camisa (e que se vê no retrato de D.Sebastião) e que na segunda metade do século XVI se tornou independente. Atingiu um tamanho exagerado nas primeiras décadas do século XVII, primeiro em diâmetro, depois em altura, sendo finalmente abandonada e substituída por mantéu de outras formas (figs. 45B e 54A). O mantéu foi muito citado nos inventários paulistas do seiscentismo. Assumiu então várias feições, desde a meia-lua muito tesa mantida no alto do pescoço à custa de uma armação feita de fio metálico, sobre a golilha (golilla, em espanhol), até à Balona, grande colarinho, largo e pendente, rodeado de rendas, que cobria os ombros inteiramente, em moda a partir de 1630 (fig. 54B).

    Em um inventário de 1593, vemos o arrolamento das peças de vestuário, com as respectivas quantidades, pertencentes a Mem Roiz (Rodrigues) de Azevedo, fidalgo da casa de El'Rei (<http://trajes.no.sapo.pt/ Documento4.htm>).
    • Três pares de calções de linho [ceroulas]

    • Dois pares de meias de linho

    • Três pares de escarpins [sapatos feitos de lençaria para serem usados sob as meias de cabrestilho]

    • Dois pares de carapuços de holanda [holanda, tecido de linho muito fino, fabricado no país desse nome]

    • Um capote pardo

    • Um outro capote pardo

    • Um bedém de fiel preto [bedém, capa mourisca, ou capa d’água, segundo o Novo Diccionario... (1806); curta e sem mangas, segundo Houaiss]

    • Uma veste de catassol branca (catassol, tecido de lã muito fino e lustroso, segundo o Novo Diccionario... (1806); aparentemente com efeito furta-cor, dado o significado da palavra acatassolado)

    • Duas capinhas com três côvados [cerca de dois metros de comprimento] de holandilha de seda com um pequeno almisque de begoin [almíscar de benjoim; seria talvez um sachet deste perfume costurado nas peças para aromatizá-las, procedimento, ao que parece, então em voga]

    • Uma capa de baeta

    • Outra de catassol

    • Uma casaca de burato [casaca, talvez versão portuguesa da casaque francesa, seria uma vestimenta semelhante a um casaco. Feita de tecido grosso, sem cintura, mas com mangas. Decorada com aplicação de passamanaria e galões, às vezes forrada de peles. Usada sobre os ombros no lugar da capa. Aparece no retrato de D. Sebastião, de autoria de Cristovão de Morais, datado de 1565] [burato, espécie de pano de seda, de que as mulheres antigamente faziam mantos, segundo o Novo Diccionario... (1806)]

    • Outra casaca de mesquela  [mesquela, tecido de mistura, segundo Fernando Oliveira]

    • Um gibão de tafetá de cordão e outro de linho [tafetá de cordão é a expressão que se usava para descrever a peculiar trama desse tecido]

    • Dois pares de botas de vaquem [vaquem, couro de vaca, segundo Fernando Oliveira]

    • Outros de cordovão [couro de cabra]

    • Outros de camelo

    • Dois pares de chapéus

    • Um chapéu preto de tafetá

    • Um chapéu preto com seu véu da China [Salvo engano, chapéu com véu era próprio do traje feminino. A peça pertenceria ao falecido, mas não seria de seu uso pessoal]

    • Outro de sol [provavelmente um sombreiro, chapéu preto de grandes abas, então característico dos portugueses]

    • Oito camisas de pano de linho. [Deve-se notar que o número de camisas pertencentes ao falecido era suficiente para serem trocadas a cada dia durante a semana. Esse detalhe nos faz desconfiar de que o finado devia ser adepto da limpeza corporal por meio do linho limpo. Ou seja, ao invés de tomarem banho, os europeus ricos da época usavam camisas de linho limpo, trocada todos os dias, pois, segundo se acreditava, isso garantia a limpeza corporal, por meio da fricção do tecido com a pele suja (ASHENBERG, p. 87 e ss.)]

    É grande o contraste entre a quantidade e a variedade das peças de vestuário existentes no guarda-roupas de um cortesão português e as peças citadas a partir de 1578 nos inventários paulistas do século XVI e XVII (BRUNO*, p. 28). Enquanto o inventário do cortesão português arrola um número bastante diversificado de peças, cobrindo praticamente todos os itens do vestuário de uma pessoa bem nascida, os primeiros inventários paulistas trazem peças esparsas, bem longe de formarem um conjunto coerente e completo. Seriam as vestimentas arroladas nos primeiros inventários paulistas trajes especiais, de pouco uso (roupas de festa ou de ir à missa). Por serem consideradas muito valiosas do ponto de vista pecuniário, passavam por diferentes mãos, atravessando gerações. Nos inventários paulistas mais antigos, porém, notamos a falta de algumas peças essenciais: não há menção a camisas, meias e sapatos. Perguntamo-nos se os falecidos haviam desgastado essas peças a ponto de tê-las tornado impróprias para serem incluídas no inventário, ou, ao contrário, teriam possuído apenas algumas peças de roupa externas, mas não camisas, sapatos e meias, andando habitualmente descalços. Adiante veremos que essas suposições não são descabidas, pois a vida na colônia conforme depoimentos contemporâneos e do século XIX, levam-nos a acreditar hoje num ambiente de vida bastante diferente daquele descrito pelos historiadores da primeira metade do século XX.

    O que se nota é que os inventários incluem quase sempre peças que não pertenciam à pessoa falecida, pois próprias do sexo oposto, confirmando que por serem custosas haviam sido herdadas e conservadas pelo morto para serem transmitidas aos parentes das gerações seguintes. Supomos que as vestes de uso cotidiano, geralmente qualificadas como velhas e gastas, só eram arroladas em caso de extrema pobreza da família do inventariado. Desse hábito de conservar trajes de gerações passadas resultava que os paulistanos, conjeturamos, deviam usar em seus melhores dias roupas de segunda mão, talvez fora do tamanho do usuário e principalmente bastante fora de moda. A indumentária espanhola, no entanto, não evoluía com muita rapidez durante o século XVII, e isso era sem dúvida grande vantagem no caso dos paulistas, embora nos inventários ocorra por cinco vezes a expressão “de uso antigo” referentes às peças arroladas (AESB).

    Ao contrário do que se pode imaginar, a moda era, sim, objeto de séria preocupação por parte dos paulistas do tempo dos sertanistas. A leitura dos inventários e testamentos deixa isso bem claro. Tratava-se de um incontornável imperativo de natureza social e não tinha por certo a dimensão fútil e consumista dos dias atuais. Era antes uma necessidade fundamental e objetiva de possuir e poder exibir uma indumentária que anunciasse adequadamente para o mundo a posição social que o usuário da vestimenta desfrutava, ou pretendia desfrutar (já que a nova sociedade em que vivia, por não estar ainda consolidada, apresentava brechas pelas quais se poderia galgar a posições superiores, ascensão que teria sido vetada na Metrópole). Envergando esse fato simbólico, o paulistano estaria apto a representar decentemente o seu papel social durante as festividades públicas, sendo esta precisamente a finalidade da chamada roupa de missa.

    A que tudo indica, esse tipo de traje era uma espécie de farda: gastava-se muito para mandar confeccioná-lo; sua função social ia bem além das fantasias de caráter pessoal que nele eventualmente pudessem manifestar-se; era aparentemente único e deveria durar longos anos, quando não atravessar gerações inteiras. O traje de cerimônia admitia por certo algumas fantasias ou extravagâncias de caráter pessoal, tal como, quem sabe, meias masculinas de cor inusitada (verde-água ou alaranjadas, por exemplo), ou uma rara mantilha descrita como estando recoberta de penas multicoloridas (inventário de João Tenório, 1634), mas a sua função principal era eminentemente de caráter coletivo e simbólico, com a capacidade de facultar a seu proprietário uma identidade precisa dentro da hierarquia geral da sociedade paulista dos Seiscentos que, apesar de tudo, mantinha caráter essencialmente estamental (o mundo afinal era uma escada, cada qual em seu degrau).

    A moda paulista apresentava então, em vista disso, um aspecto muito particular, em que as roupas, sem serem propriamente luxuosas – e até algo descompassadas em relação à moda européia e à de outras partes do Brasil colonial, mais integradas ao Império espanhol –, não deixavam de provocar, decerto, muita rivalidade e emulação entre os componentes da sociedade local, sobretudo após as missas de domingo, ocasiões em que os paulistanos provavelmente se retardavam a fim de se socializar.

    Sem dúvida, a ostentação suntuária dos domingos e dos dias de festa, não era fenômeno exclusivo da São Paulo seiscentista, muito pelo contrário, era uma instituição brasileira que remontava seguramente à tradição portuguesa de antes da Era dos Descobrimentos. Muitos viajantes estrangeiros do século XIX ficaram impressionados, em diferentes pontos do Brasil, com a quantidade de ouro exibida por todas as camadas sociais em qualquer tipo de cerimônia, quer de natureza religiosa quer de natureza profana. No início do século XIX, para mais alardear riqueza, muitos dos enfeites das senhoras iam parar nas orelhas, colos, braços, pulsos e dedos das inúmeras mucamas que as acompanhavam nas missas. Nem os pobres ficavam de fora dessa corrida ao ouro. Segundo o missionário metodista norte-americano Daniel Kidder (1815-1891), em viagem pelo País entre 1836 e 1837, a ostentação como forma de diferenciação social já não tinha a menor eficácia entre os brasileiros:
      [...] o apuro do vestuário não constitui, no Brasil, índice de condição ou de nível social. As classes inferiores exaurem seus recursos em adornos domingueiros [...] (KIDDER, p.193)


    Continua > Parte 3




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    Para citação adote:

    CAMPOS, Eudes. Pequena contribuição para o estudo da indumentária dos primeiros paulistanos. INFORMATIVO ARQUIVO HISTÓRICO DE SÃO PAULO, 5 (27): out.2010. <http://www.arquivohistorico.sp.gov.br>

     
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