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PMSP/SMC/DPH
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São Paulo, novembro/dezembro de 2008
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Ano 4 N.21
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Edifício Ramos de Azevedo: arquitetura
Trecho do laudo realizado pelo arquiteto Eudes Campos, incorporado ao
Projeto de restauro e reforma
'EDIFÍCIO RAMOS DE AZEVEDO': I ETAPA (1989),
como parte do segmento
II – Identificação do Imóvel.
(revisto pelo autor)
A análise tipológica do Edifício Ramos de Azevedo parece desmentir a informação segundo a qual a edificação resulta da
adaptação das obras paralisadas do Ginásio do Estado. De fato, ao que parece, o projeto foi concebido desde o início para o
fim a que foi destinado. Deveria acolher o curso de engenheiros eletricistas, criado em 1907, e o laboratório de maquinas e
eletrotécnica, finalidades essas já evidenciadas no projeto exposto à apreciação pública em 1908.
Destas duas, acabou sendo considerado o laboratório a atividade mais importante da edificação, advindo dessa escolha e partido então
adotado.O método de projetação a partir da identificação das funções primárias do edifício é típico do academismo da segunda
metade do século XIX, preocupado especialmente em apurar e refinar a tipologia edificatória então conhecida.
O projetista deveria expressar planivolumetricamente a natureza do edifício, isto é, tanto através da adequada disposição interna
dos espaços principais, quanto através da predominância volumétrica e decorativa conferida às massas exteriores,
correspondentes àqueles mesmos espaços.
Assim, no caso do Edifício Ramos de Azevedo, foi eleito o corpo do laboratório o compartimento dominante em torno do qual seriam agregadas
as outras dependências do edifício. Concebido como um pátio coberto, já que seus fins eram eminentemente utilitários, deveria ser aquele
espaço suficientemente amplo para receber o aparelhamento necessário a pesquisas, experiências em máquinas e equipamentos de
grande porte, e atividades curriculares. Não só ocuparia a parte central da edificação, como também ultrapassaria em altura o
resto da construção. Isolado das outras peças por intermédio de áreas de circulação, para ele se abririam janelas internas, as
quais permitiriam aos estudantes estar em constante contato com o que ocorreria naquele local.
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Corte transversal (sul-norte). ([s.d.]).
Destaca-se no conjunto o pátio coberto, ao centro; à direita, o anfiteatro.
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Acervo AHMWL/DPH/SMC/PMSP
Externamente receberia tratamento privilegiado apresentando cobertura sombranceira que dominaria todo o edifício, funcionando
como o ponto de interesse da composição, numa franca declaração de que era a atividade ali desenvolvida que caracterizava
essencialmente aquele tipo de edificação.
Simétricos em relação ao eixo longitudinal, agenciaram-se as antigas salas de aula e demais compartimentos; ao fundo, posicionou-se o
anfiteatro, cujo hemiciclo se projetava para fora do perímetro retangular da construção, exteriorizando desse modo outra atividade
relevante a que a edificação se destinava, a função didática.
Planta do andar térreo. [s.d.].
Esta prancha corresponde a uma versão anterior do projeto, apenas com dois pavimentos: subsolo e térreo. Observe-se que as escadas laterais não existem, correspondendo aqui a salas.
Ao redor do pátio coberto, uma ampla área de circulação garante o acesso a todas as dependências. Aqui, o acesso principal ao Edifício, na
parte inferior da imagem, indica duas salas laterais com portas no patamar intermediário, solução abandonada na obra edificada.
Veja no segmento Edifício Ramos de Azevedo: histórico um estudo da fachada com dois pavimentos.
Acervo AHMWL/DPH/SMC/PMSP
Como resultado dessa concepção arquitetônica, a aparência externa do edifício apresenta-se composta de três volumes articulados,
porém nitidamente definidos: o paralelepípedo formado de dois pavimentos mais porão; o corpo alteado do laboratório,
que se ergue a partir do centro da construção; e o saliente volume arredondado do anfiteatro, que se destaca na fachada posterior.
Enquanto os dois últimos volumes abrigam espaços únicos, privilegiados graças à relevância de suas funções, o corpo prismático de
dimensões maiores reúne todas as outras peças consideradas secundarias.
Fachada norte. [s.d.]. Escala 1:100
Destacam-se os volumes da cobertura do pátio central e do anfiteatro, ao fundo da edificação. Observem-se os terraços no
primeiro pavimento, eliminados com a construção, em data ignorada, de novas dependências.
Acervo AHMWL/DPH/SMC/PMSP
Para a composição dos alçados recorreu-se ao vocabulário decorativo de origem clássica, manipulado com a liberdade característica do
período arquitetônico a que o edifício pertence, o Ecletismo.
A elevação principal é subdividida como de hábito em três corpos que avançam ligeiramente em relação ao resto da construção.
No corpo central, abre-se o pórtico em arco pleno, ocupando a altura dos dois pavimentos, e pelo qual se ascende ao vestíbulo por meio
de alguns degraus.
Logo acima do sóbrio embasamento de granito, perfurado por respiradouros retangulares, eleva-se o térreo, valorizado por
discreta bossagem, reduzida a simples linhas paralelas horizontais. O ritmo dessa região das fachadas é dado pelas envasaduras,
ora largas ora estreitas, que se alternam com grossas pilastras sem base nem capitel, só rematados por ressaltos.
A ordem jônica na altura do térreo aparece unicamente nas colunas que ladeiam a entrada principal. O entablamento
correspondente circunda todo o edifício, tornando clara a distinção entre os dois andares.
Na parte referente ao piso superior, a composição possui ritmo mais sincopado, em virtude dos vários elementos que se sucedem:
as pilastras coríntias grupadas, dispostas sobre pedestais, os painéis decorativos e as envasaduras tripartidas de dois modelos
diferentes, empregados distintamente na parte central das fachadas e nos antecorpos terminais.
À guisa de cimalha, observa-se o emprego do entablamento coríntio. Por sobre esse elemento de remate, correm as platibandas, pontuadas de
pilaretes e interrompidas na elevação principal por trechos sobrelevados a coroar os antecorpos terminais e o pórtico de entrada.
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Fachada sul, acesso principal. [s.d.].
Apesar do mau estado de conservação da prancha, é possível distinguir o embasamento em granito, as colunas em ordem jônica no térreo e, acima, as
"pilastras coríntias grupadas". Neste documento, observam-se os grupos escultóricos presentes em várias pranchas, mas não executados.
Ao lado, no destaque, figuras decorativas e distribuição das ordens.
Acervo AHMWL/DPH/SMC/PMSP
Alçando-se acima do telhado, o corpo correspondente ao laboratório central concorre para a monumentalidade da composição. Sobre um
embasamento ornado de singelas molduras apóia-se a cobertura metálica, de formas infladas, típicas das construções de fins do
oitocentismo. Frontal e posteriormente, lunetas propiciam a iluminação do laboratório. Essas aberturas semi-circulares
por sua vez são flanqueadas por pares de meias-colunas dóricas que, além do respectivo entablamento suportam maciços pináculos
de inspiração secessionista (inspiradas no estilo austríaco então em moda chamado Sezessionstil, responsáveis pelo ar majestoso do conjunto.
Corte transversal da cobertura do pátio central. [s.d.].
Acervo AHMWL/DPH/SMC/PMSP
Na parte posterior, o volume do anfiteatro é tratado, por contraste, com um claro-escuro bastante acentuado. Pilastras dóricas sobre
pedestais rusticados, suportando fragmentos de entablamento, revezam-se com ordens verticais de aberturas, abaixo cegas, acima
verdadeiras. A platibanda existente neste setor do edifício interrompe-se na prumada dos elementos de sustentação, dando
lugar a ornatos semelhantes a antefixas, decoradas por palmetas. Lamentavelmente, o feliz resultado alcançado na fachada do
fundo só pode ser apreciado em sua totalidade na elevação aquarelada constante dos planos do edifício. A implantação
desfavorável em terreno de pouca profundidade impossibilita, desde sempre, a fruição desse efeito estético, que assim acabou desperdiçado.
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Fachada leste. ([s.d.]). Escala 1:100
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Acervo AHMWL/DPH/SMC/PMSP
É curiosa a ornamentação a que se recorreu neste projeto. Algumas alegorias escultóricas originalmente previstas não se concretizaram,
porém relevos nas fachadas e vitrais em seu interior revelam evidente função simbólica, de fácil reconhecimento. Só chamamos a atenção
para os "tondi" localizados nos rins das lunetas do laboratório, nos quais se estampam, como emblemas da instituição, partes de
maquinismos (famosos dispositivos inventados para as máquinas a vapor, chamados reguladores de Watt),
numa clara intenção de reafirmar a destinação daquele volume.
A sede do Laboratório de Máquinas e Eletrotécnica, ao tempo em que foi erguida, mantinha-se suficientemente apartada das construções
vizinhas, o que lhe garantia a qualidade da ambientação. Hoje, acha-se rodeada de edifícios que impedem a observação de muitos dos
seus ângulos. No fundo, um prédio de vários andares, a "Casa do Politécnico", rompe brutalmente com a escala harmoniosa das
imediações, chegando mesmo a ocupar parte do exíguo lote original.
Conjunto Edifício Ramos de Azevedo, 2008.
Observe-se a proximidade entre as três edificações:
Edifício Ramos de Azevedo, à direita; Casa do Politécnico, à esquerda; e o galpão anexo, abaixo.
Fotógrafo: André Douek (SAN/DIM/DPH/SMC/PMSP)
O edifício, de acordo com a técnica construtiva usual na época, foi erguido sobre paredes autoportantes de
alvenaria de tijolos revestidos de argamassa sobre embasamento de pedra. Os pavimentos assoalhados descansam sobre
estrutura autônoma de madeira, ao passo que as partes molhadas e o laboratório central possuem piso de ladrilhos hidráulicos,
ou pisos cimentados assentados sobre abobadilhas de tijolos.
A cobertura do edifício, por sua vez, é feita por meio de telhas "francesas" ou "mecânicas", de barro; exceto nas
partes correspondentes ao laboratório e ao anfiteatro.
Na primeira dessas peças, o fechamento superior, sustentado por treliças metálicas aparentes,
é parcialmente vedado por chapas de cobre nas semi-abobadas de barrete de clérigo.
A porção central daquele espaço, no entanto, é resguardada por telhado de duas águas, imediatamente sob
o qual se acha instalado o sistema de ventilação permanente, constituído por venezianas laterais (desde o restauro substituídas por caixilhos de
vidro). Nessas duas águas
originalmente estavam dispostas placas de ardósia, ocorrendo a mesma solução na cobertura do anfiteatro.
Hoje, esse material acha-se substituído por placas de cimento.
Digno de nota é ainda o forro estucado existente nas dependências internas do edifício. Sua base
é formada por elementos cerâmicos pré-fabricados de 21 x 12 x 2,5 cm aproximadamente, aderidos uns aos outros por meio
de encaixes macho-e-fêmea e sustidos por intermédio de tirantes metálicos presos ao vigamento existente. São valiosos esses
elementos, porque constituem solução técnica da qual se desconhecem outros exemplares.
Fonte
- Projeto de restauro e reforma 'EDIFÍCIO RAMOS DE AZEVEDO': I etapa. São Paulo: PMSP/SMC/DPH/Divisão de Preservação/
Seção Técnica de Projetos, Restauro e Conservação, [1989].
Para citação adote:
CAMPOS, Eudes. Edifício Ramos de Azevedo: arquitetura.
INFORMATIVO ARQUIVO HISTÓRICO MUNICIPAL, 4 (21): nov/dez.2008 <http://www.arquivohistorico.sp.gov.br>
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EXPEDIENTE
coordenação
Liliane Schrank Lehmann
edição de texto
Eudes Campos
estagiário - pesquisa
Arthur Henrique do Patrocínio
webdesigner
Ricardo Mendes
distribuição
Maria Sampaio Bonafé (coordenação)
Elisabete De Lucca e Irene do Carmo Colombo
Normas Editoriais
(2007)
(formato PDF)
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