PMSP/SMC
São Paulo, dezembro de 2014
Ano 10 N.37 

Abertura | Acervo Bibliográfico | Ensaio temático | Mosaico 1:1.000 e 1:5.000 | Notícias | Ns.anteriores

  • ENSAIO TEMÁTICO
  • S.A.R.A. Brasil:
    restituindo o Mapa Topográfico do Município de São Paulo


    breve história da aerofotogrametria nas cidades do Rio e São Paulo na década de 1920






    Mistérios e desafios

    Registrar o impacto da disponibilização a partir de meados da década de 1930 dos conjuntos de pranchas do Mapa Topográfico do Município de São Paulo é tarefa complexa, marcada antes de tudo pela multidisciplinaridade, reflexo do extenso rol de usos e funções que essas cartografias adquiriram nas décadas seguintes.

    No momento mais imediato, nas décadas de 1930 e 1940, seus produtos são instrumentos de referência nas diversas áreas a que se destinavam. Seja no âmbito da administração pública, no cotidiano de setores voltados ao planejamento urbano, à manutenção da infraestrutura, ao cadastro imobiliário; seja no quadro além muros da municipalidade, nos campos mais variados como apoio ao registro e avaliação de imóveis, ensino técnico, etc etc.

    Razões diversas levarão o Executivo municipal a realizar em meados do século XX novo levantamento aerofotogramétrico da cidade. Entre tantas, a mais óbvia, o explosivo crescimento urbano, aspecto agravado, na matriz de exigências instrumentais, pela falta de atualização de dados cartográficos por parte da municipalidade, uma ação que permitisse garantir uma sobrevida a tal ferramenta de trabalho.

    Aspecto importante é destacar que agora essa empreitada se dá em bases novas, condição que raramente é considerada. Entre ela a existência de um corpo técnico municipal ampliado e diversificado, um quadro de formação de especialidades igualmente mais complexo considerando-se os diversos polos universitários locais e regionais, e, por último, uma cultura gerencial na qual um instrumental desse gênero é fato incorporado, intrínseco. A decisão arriscada, realizada ao final da década de 1920 pelas administrações paulistana e carioca, que levou à opção por uma nova tecnologia, aplicada nesses casos em condições específicas, pode avançar agora em bases mais sólidas, críticas.

    O Mapa Topográfico foi utilizado até 1950 de forma ampla. Caso exemplar é o da Light & Power, empresa de fornecimento de energia elétrica para a capital, que emprega essa cartografia, recorrendo ao longo do tempo a atualizações suplementares.

    A perda, ao longo dos anos, da rede de referência terrestre utilizada no levantamento é apontada em várias ocasiões como ocorrência grave, exigindo que fosse refeita em novo empreendimento (PEIXOTO, 1955, p.25-26)311. Em 1949, quase 20 anos depois, registram-se os primeiros estudos “para proceder ao levantamento topográfico e cadastral de todo o Município de São Paulo. A primeira parte desses serviços consistirá no levantamento aerofotogramétrico do Município, em moldes semelhantes ao do S.A.R.A., executado entre 1928 e 1930.”312

    Os usos e funções posteriores do levantamento SARA Brasil, pensando em especial nos últimos 30 anos, têm como destaque mais visível o quadro dos estudos históricos sobre a metrópole, que se expandem em suas facetas acadêmicas ou não. Se no caso carioca, numa perspectiva mais imediata este aspecto não possa ser registrado mais claramente — exceçâo feita à obra de Jorge Czajkowski (2000) —, no caso paulistano a referência breve “SARA” se tornou coloquial313.

    No entanto, no terreno do que se poderia chamar de uma história da ciênca — e aqui pensando que esta teria de dar conta de tantos campos como as histórias da fotografia, da cartografia, dos instrumentos óticos, da impressão gráfica, dos processos produtivos e gerenciais afetos, e aqui, é óbvio, até mesmo da aviação — os estudos históricos sobre espécimes destacados da produção cartográfica brasileira, voltados para a gestão urbana em sua origem, pouco resultaram em intensidade e profundidade que refletissem a importância daquelas realizações.

    Nesse contexto, o primeiro conjunto documental de processos administrativos relativos a produção do SARA — forma referencial que adotaremos a partir daqui — integrado em 2009 ao acervo custodiado pelo Arquivo Histórico de São Paulo é uma contribuição importante para os estudos “genéticos” desse marco na cartografia paulistana. Uma demanda por informações existe. E desse conjunto um primeira pesquisa de mestrado já surge, apresentada em 2013, à Escola Politécnica-USP, por Erly Lima.

    Aspecto nebuloso, porém, diz respeito à completa dispersão, desvio e destruição que pode ter sofrido o conjunto de documentos produzidos pela SARA Brasil, seja quanto às pranchas impressas, seja quanto à documentação técnica. Um aspecto, primeiro, diz respeito às pranchas impressas, itens em série, que fora raras instituições com setores especializados em cartografia, acabam por permanecer fora dos catálogos e em condições inadequadas de conservação e acesso.

    A leitura da parca historiografia que faz menção ao Mapa Topográfico sofre com essa condição e, a partir dessa situação, multiplica a desinformação, repassando dados não confirmados, especulações sem bases referenciadas. Torna-se necessário fazer um balanço dos produtos realizados em 1934 e daqueles remanescentes em acervos e coleções.

    Deixemos de lado, registros e documentos já arrolados. Primeiro, o mosaico fotográfico do Rio Tietê, realizado no primeiro trimestre de 1929, provável marco zero da operação. Segundo, as 10 imagens, cópias positivas, que integram o acervo AHSP, registrando em escala 1:5.000, trecho das Avenidas Paulista e Brigadeiro Luis Antonio, únicos remanescentes de atribuição plausível da cobertura fotográfica realizada. Terceiro, por fim, os processos administrativos relativos ao edital, hoje incorporados ao acervo AHSP.


    Sobre os produtos previstos em contrato, contudo, é necessário avançar com cautela. Lembre-se que o edital e o contrato explicitam produtos em parte distintos. No primeiro consta apenas a produção do levantamento em escala 1:5.000 de todo o município, entregues na forma de fotocartas, com tiragem de 25 exemplares314, acompanhadas das pranchas impressas com tiragem de 5 mil exemplares, além das cópias em papel transparente, com 6 exemplares, para reprodução em papel ferro prussiático ou similar315. Todas elas estão associadas à entrega do “respectivo original”, o que pode ser entendido como os negativos fotográficos da cobertura, os negativos compósitos relativos às fotocartas, e os desenhos cartográficos e respectivas pedras litográficas.

    A produção do levantamento em escala 1:1.000 é, no edital, uma cláusula em aberto para negociação, não uma exigência. São previstos aqui dez exemplares de fotocartas, mil para pranchas impressas e 6 para cópias em papel transparente. No caso das fotocartas, prevê-se a entrega dos originais sem retoque, montados em chapas de alumínio.

    Meses depois, o contrato faz alterações. Os produtos incluem a entrega efetivas dos levantamentos nas escalas 1:5.000 e 1:1.000, sendo na última escala prevista uma tiragem de 1.000 unidades de pranchas impressas. A inclusão é mudança significativa, pois esta escala se tornará marca distintitiva do projeto considerado-se o limite técnico apontado então para esse parâmetros.

    Em janeiro de 1934, o ato legal que aprova as plantas apresenta informação nova. Além das edições nas duas escalas, surge uma referência direta a uma edição em escala 1:20.000, sem previsão de entrega316. Não há registro, nem no ato, nem em processos, de entrega das fotocartas e das cópias em tela transparente, nem a destinação da guarda destes últimos dois itens.

    Outro problema usual, a partir da possibilidade de compra de pranchas isoladas, bem como da catalogação das cartografias disponíves em acervos paulistanos, diz respeito à integridade de cada conjunto. Embora cada prancha possua numeração individual no canto superior direito relativa ao setor coberto, e conste em cada lateral da mesma a referência às pranchas conexas, o fato de não terem sidos produzidos mapas índices ou a inclusão eventual em cada prancha de um mosaico reduzido, acabou por gerar grande confusão.


    A ausência de mapas índices das pranchas, para cada escala, levou a duas iniciativas nesse sentido. Uma, em escala 1:50.000, com data de agosto de 1933, o que indica sua execução imediatamente após a retirada da última remessa do porto de Santos317. Organizado pela Diretoria do Cadastro do Departamento Central de Estatística Imobiliária, o índice foi produzido por L. Girardelli. Peixoto (1955, p.25) inclui Lauro Girardelli como fiscal do projeto, por parte da Prefeitura, embora seu nome não conste nos processos recolhidos318. Não se conhece a prancha original desse índice, apenas diversas cópias heliográficas, necessárias no uso cotidiano para acesso ao conjunto e sua comercialização inicial.

    Essa primeira versão introduziu dois erros que associados a alguma decisões do projeto gráfico do Mapa Topográfico estabeleceram mal entendidos ao longo do tempo. O mapa índice permite o acesso ao mesmo tempo às duas escalas: o levantamento de todo o município em 1:5.000 e o levantamento da zona central em 1:1.000.

    O conjunto mais extenso, em 1:5.000 está dividido em 82 setores. Cada prancha corresponde em princípio a um setor. No entanto, por economia, um grande conjunto de setores, na cobertura relativa à zona rural, acabaram sendo agrupados em pranchas duplas ou triplas. Assim os 82 setores são apresentados em 69 pranchas, correspondentes a 53 pranchas simples, 13 duplas e 3 triplas. A numeração é continua, da esquerda para direita, de cima para baixo. No entanto, as pranchas compostas apresentam numeração “compósitas” como “73-74” e “74-75”. Além disso, uma das pranchas, por cobrir área mínima, acabou sendo incorporada à prancha lateral. É o que o que aconteceu com a prancha 76, incorporada a de número 68. Eventuais confusões se seguem até hoje a partir desses aspectos.

    O conjunto relativo à zona central, em 1:1.000, por sua vez, está sobreposto ao anterior no mapa índice. As 58 pranchas produzidas, número regularmente presente nos processos e cartas como vimos, corresponde a 7 setores, respectivamente 36, 37, 50, 51, 52, 64 e 65. Cada um deles foi desdobrando seguindo uma matriz de 25 subsetores, nem todos executados por não cobrirem área de interesse. Aqui, Girardelli introduziu uma problema ao incluir as pranchas 52-09 e 52-10.

    A simples observação das referências impressas nas laterais de cada prancha, que indicam em linha cheia o número das pranchas de conexão e em linha pontilhada aquelas não disponíveis naquele momento, permitiria compreender o erro. Outro mapa índice, muito circulado, data de 14 de outubro de 1937, produzido pelo mesmo setor, copiado por Cid Wasth Rodrigues, faz essa correção.

    Sobre o conjunto impresso em escala 1:20.000 desconhece-se a data de entrega. Pouco usual em acervos, ele é composto por 5 pranchas, numeradas em algarismos romanos. A edição, como as demais. não apresenta uma mapa índice, ainda que composta por tão poucas lâminas. Peixoto mais uma vez é a única fonte, até o momento, quanto à tiragem: 3 mil exemplares para a área central, que corresponde a uma única prancha, e 1 mil para o resto do município, em 4 pranchas. Uma edição impressa, em escala 1:10.000, está registrada, parcialmente, no catálogo da Biblioteca Nacional, únicos exemplares conhecidos até o momento. Quase certo, tal edição corresponde a uma derivação realizada em 1937 pelo Gabinete Photocartographico do Estado Maior do Exército319.

    Os dois levantamentos — nas escalas 1:5.000 e 1:1.000 — aqui reproduzidos, bem como as pranchas disponíveis nas duas escalas para download, tem a função assim de contornar esses problemas relativos à integridade de cada coleção em escalas distintas.


    A presença desses conjuntos impressos em acervos paulistanos é recorrente, mas quase sempre fragmentada, incompleta, sem catalogação precisa e muito menos mapas índices. Seria oportuno comentar alguns casos, pois revelam apropriações por usuários especializados e registrar também o estado de conservação e forma de acesso atual.

    SARA Brasil - AHSP - armário - garra metálica

    Mapa Topográfico do Município de São Paulo, 1930
    Pranchas armazenadas verticalmente em armário de madeira,
    provavelmente da década de 1940, de procedência ignorada.

    Conjunto composto por dois armários, com 2 e 3 portas, para conjuntos
    nas escalas 1:1.000 e 1:5.000, sendo as pranchas enteladas suspensas
    por guias metálicas na parte superior.

    foto: André Douek
    Acervo AHSP

    Exemplo excepcional está presente no acervo AHSP. Os dois conjuntos — nas escalas 1:5.000 e 1:1.000 — estão montados sobre tela de algodão, solução tradicional na cartografia até meados do século XX, o que garantiu a conservação, apesar do uso corrente. As pranchas estão abrigada em dois armários de madera, sem origem conhecida, mas provavelmente datados da década de 1940. Cada armário, possui acesso tanto por portas frontais, como pela parte superior, sendo as pranchas armazenadas na posição vertical. Cada prancha possui uma guia metálica na parte superior, que permite o apoio nas canaletas laterais.
    AHSP-SARA-Armário madeira década 1940
    Mapa Topográfico do Município de São Paulo, 1930
    Pranchas armazenadas verticalmente em armário de madeira,
    provavelmente da década de 1940, de procedência ignorada.

    Animação de imagem indica as formas de acesso aos originais.

    foto: André Douek
    Acervo AHSP

    No caso da Fundação Energia e Saneamento, depositária do acervo da Light & Power, há séries completas de pranchas, mas chama a atenção os volumes encadernados, organizados pelo Departamento de Relações Públicas, sem datação. A opção, nesse caso, para facilitar o manuseio, foi reunir os conjuntos, nas escalas 1:1.000 e 1:5.000, em dois volumes. Os cabeçalhos das pranchas foram cortados e cada setor montado sobre cartão. Ambos os volumes reproduzem o mapa índice, produzido em 1933, com a correção sobre as pranchas introduzidas erroneamente (folhas 52/09 e 52/10). A capa de cada conjunto é revestida em tecido com aplicação do título. O tecido esconde, porém, a capa original em couro, com gravação a ouro do título da edição: “Município de São Paulo ; vol. (...)”.


    Das cópias das pranchas em tela transparente há apenas registro de entrega entre agosto e setembro de 1931 das primeiras 17 pranchas na escala 1:1.000 (processo 46.249/31). Artigo de Francisco Peixoto (1955, p.25) é a única fonte bibliográfica que traz referência a esses itens. O autor indica a edição de pranchas em tela, com tiragem de 10 exemplares cada, nas escalas 1:5.000 e 1:10.000, dados que não era possível confirmar.

    Foram localizados, durante a fase de pesquisa para a atual edição, entre pranchas em duplicata no acervo AHSP, exemplares de dois conjuntos. Embora incompletos, tratam-se das edições em escala 1:5.000 e 1:1.000, e não dez mil como indicava Peixoto320. Totalizam cerca de 76 pranchas, frente à soma de 127 pranchas previstas321.

    SARA Brasil - AHSP - cópia em tela transparente

    Mapa Topográfico do Município de São Paulo, 1930
    Detalhe de prancha impressa sobre tela de linho,
    utilizada como matriz de reprodução de cópias.

    Um brilho suave e a trama visível do linho
    são característicos desse produto.

    Acervo AHSP

    As pranchas em tela de linho apresentam boas condições, melhores que as usuais em exemplares em papel, não entelados, da mesma edição. A estrutura do tecido não apresenta rasgos, apenas parte amassadas, com uma única exceção identificada que ocorreu segunda a direção das fibras. Há menor ocorrência de pontos de oxidação e alterações de cor, provavelmente gerados por contaminação devido ao armazenamento junto a pranchas impressas sobre papel.

    SARA Brasil - AHSP - comparativo cópias em tela e papel

    Mapa Topográfico do Município de São Paulo, 1930
    Ampliação (300 x) de detalhe de impressão sobre tela e sobre papel.

    foto: AHSP/SCA - Zinia Carvalho
    Acervo AHSP

    Foi possível realizar no laboratório da Supervisão de Conservação do Acervo (AHSP) uma primeira avaliação material das cópias em tela. Os testes realizados pela especialista Zinia Maria Cavalheiro de Carvalho consistiram numa análise visual, com identificação das fibras, e num teste de combustão de fibra que comprovou a origem natural, não sintética do material. Um exame visual com aumento de 300x permitiu identificar claramente a estrutura do tecido e primeira análise da impressão. Embora não seja possível confirmar, trata-se aparentemente de impressão sobre uma camada extremamente fina, provávelmente papel, aplicada sobre o linho
    322.


    Das fotocartas, não havia registros conhecidos. Previstas em contrato, não se sabia de exemplares remanescentes em acervos. Com edições de 25 exemplares conforme contrato, Peixoto (1955, p.25) indicava, porém, a produção de “10 cópias de fotocartas, na escala de 1:5.000, abrangendo o centro urbano e suburbano; 10 cópias de fotocartas, na escala de 1:10.000, abrangendo todo o município”. A referência à área de cobertura na escala 1:5.000 introduz um problema: qual seria o total de pranchas?

    Fotocarta - SARA Brasil - MP-USP

    Fotocarta do Mapa Topográfico do Município de São Paulo, 1930
    Escala 1:5.000 - prancha 39

    Acervo Museu Paulista-USP

    Embora não registradas na historiografia sobre o tema, foram localizados no acervo do Museu Paulista, da Universidade de São Paulo, em sua biblioteca, exemplares de fotocartas nas duas escalas. Montadas sobre tela, e não “estiradas” sobre chapas de alumínio como indica o contrato assinado, as pranchas apresentam boas condições. Sem manchas e nem rasgos significativos, a montagem em tela garantiu sobrevida ao material323.

    O conjunto não está inventariado no catálogo eletrônico, mas alguns sinais indicam que integram o acervo da instituição há várias décadas. O primeiro é o carimbo da biblioteca aplicado em todas as pranchas, ainda referenciada como “Bibliotheca”, forma usual até a Reforma Ortográfica de 1943. O segundo sinal são anotações à lápis no verso, na cor azul, em padrão muito comum em outras ocorrências na biblioteca no mesmo período.

    Fotocarta - SARA Brasil - MP-USP

    Fotocarta do Mapa Topográfico do Município de São Paulo, 1930
    Escala 1:5.000 - prancha 39: detalhe do estádio do S.C. Corinthians Paulista

    Acervo Museu Paulista-USP

    A série de fotocartas em escala 1:10.000 é composta por 20 pranchas, numeradas em algarismos romanos, com cabeçalho similar à edição impressa, em cópias fotográficas monocromáticas. Os fotomosaicos embora não tão ricos em escala tonal apresentam a cobertura do município em sua totalidade. Cada prancha corresponde a 4 setores da escala 1:5.000, sendo indicadas sobre a imagem as folhas respectivas nesta última escala.

    A série de fotocartas em escala 1:5.000 remanescente apresenta 13 pranchas324. Embora nossa fonte não precise quais seriam as pranchas relativas ao “centro urbano e suburbano”, é possível um especulação. As “photo-cartas da parte central” como indicado no cabeçalho apresentam uma área maior que as mesmas pranchas desdobradas na escala 1:1.000 – 36, 37, 50, 51, 52 e 65, com apenas uma única ausência: a prancha 64.

    Excetuando a área coberta por esta última, relativa a ocupada posteriormente pelo Parque do Ibirapuera e parte do Jardim Europa, as fotocartas na escala em questão abrangem a quase totalidade da zona central do período. Mas as demais sete pranchas permitem apresentar no mosaico final uma área que se estende de oeste a leste, em 3 longas faixas horizontas. A primeira, cobrindo a calha do Rio Tietê, da Lapa a Penha; a segunda, na parte inferior, do Largo de Pinheiros ao alto da Avenida Paes de Barros, e a terceira, por fim, da Vila Mariana, no trecho ocupado pelo Instituto Biológico, à Vila Alpina, a esta da Vila Prudente. Surpreendente registro!

    Seria possível inferir a zona suburbana a partir dos limites adotados pela legislação da época. A lei nº 2.775, de 13 de novembro de 1924, que inclui novos logradouros na zona suburbana da capital, apresenta os perímetros externos das zonas urbanas e suburbanas. Esse limites comprovam que o conjunto remanescente das fotocartas na escala 1:5.000, acreditando nos dados apresentados por Peixoto (1955), corresponde efetivamente à edição final, com a perda restrita à folha 64.



    Mapa Topográfico do Município de São Paulo: produtos entregues
    Produtos
    Escala
    Total efetivo
    de pranchas
    Acervos principais
    Pranchas impressas em papel
    1:20.000
      5
    BMA
    1: 5.000
     69
    AHSP, BMA
    1: 1.000
     58
    AHSP, BMA
    Pranchas impressas em tela transparente
    1: 5.000
     69
    AHSP * (30)
    1: 1.000
     58
    AHSP * (46)
    Fotocartas
    1:10.000
     20
    MP-USP
    1: 5.000
     [14]
    MP-USP * (13)
    * únicos conjuntos parciais conhecidos

    As referências a acervos são de caráter indicativo, apenas visando referenciar coleções completas no âmbito de SMC e, em especial, registrar cópias únicas como pranchas em tela transparente, no acervo AHSP e fotocartas localizadas no Museu Paulista (USP).



    Rumo a uma nova geração de pesquisas

    Novos desdobramentos para a pesquisa histórica sobre aerofotogrametria a partir das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, no contexto aqui apresentado, podem ser propostos. Parece fundamental rever com mais atenção o desenvolvimento do Serviço Geográfico Militar e suas experiências na cobertura da capital federal na década de 1920. Outro rumo está em recuperar ações desenvolvidas por iniciativas como os estudos de intervenções em trechos urbanos do rio Tietê, na capital, as quais são referenciadas em notas na imprensa a partir do debate sobre a execução do Mapa Topográfico em 1928325.

    Numa primeira avaliação sobre as duas décadas seguintes, que precedem, no caso paulistano, ao novo levantamento aerofotogramétrico da capital em meados de 1950, é possível observar alguns características importantes.

    Após as duas ações pioneiras entre 1927 e 1928, um longo hiato quanto a iniciativas para mapeamentos de grandes centros urbanos do Sudeste parece ocorrer. Em parte deve-se apontar o pioneirismo das administrações das capitais federal e paulista ao propor novas ferramentas de apoio à gestão urbana num contexto de renovação das gestões técnicas ainda restritos aos núcleos de maior porte.

    Registram-se na década seguinte movimentos similares em capitais como Porto Alegre. Em julho de 1939 previa-se a realização pelo Sindicato Condor Ltda – “única empresa nacional... aparelhada” a execução até final de 1941 dos mapeamentos nas escalas 1:1.000 e [1:2.000], com equipamentos encomendados à Casa Zeiss-Aero-Photography326.

    Ao mesmo tempo é importante apontar a existência de representações locais de grandes fornecedores como a italiana Filotecnica Samoiraghi, já mencionada, ou a alemã Zeiss327. Ao mesmo tempo, consultores em viagem de serviço aproveitam para fazer contatos. Um exemplo ocorre em 31 de julho de 1931, quando o Instituto de Engenharia recebe Enrique Weidinger. Graduado pela Politécnica de Viena, com atuação na Suíça, França, Aústria e na Espanha, Weidinger percorre a América Latina fazendo divulgação de equipamentos. Vários deles, adquiridos pelo Equador, são objeto da conferência, em que são mostrados trabalhos realizados naquele país e na Suíça328.

    Ao longo da década de 1930, além das ações desenvolvidas em órgãos governamentais, muitas vezes no interior do país, como são os casos do Serviço Geográfico ou da Inspetoria Federal de Obras contra a Seca (IFOCS)329, merece registro a presença de pequenos empreendedores. Quase certo, além da produção de fotografias aéreas oblíquas, voltam-se para empreitadas de menores exigências, produzindo mosaicos (controlados, talvez) em pequena escala.

    No panorama paulista, por exemplo, o acervo do Museu da Energia (FES), em seu núcleo cartográfico com forte presença da documentação gerada pela empresa canadense Light & Power, reúne exemplos de destaque. Num recorte entre o final da década de 1920 e a seguinte, podem ser relacionadas diversas coberturas em suas áreas de atuação. Para ser preciso, 16 conjuntos entre 1928 e 1941. Entre elas, a calha do Rio Pinheiros, em seu trecho urbano, ou, digamos, sendo preciso, na fronteira em expansão dos bairros a oeste, bem como coberturas de trechos da Serra do Mar, na qual estão situados reservatórios como Billings etc.

    Pelo menos seis conjuntos, produzidos entre 1928 e 1938, foram realizados por Nelson Smith. Imagens, por exemplo, datadas de 1931, da Serra do Mar, trazem carimbos no verso, como também identificações nos mostradores associados ao registro fotográfico, anunciando: “PHOTOGRAPHIAS AEREAS/ G NELSON-SMITH/ Rua Augusta, 462-A – S.PAULO/ Teleph. 7-6231/ PHOTOGRAMMETRIA”330. Em outras, sob uma logomarca em formato piramidal, formada pelas letras GNS, surgem também telefones de contato em São Paulo e no Rio de Janeiro.

    Os conjuntos remanescentes, de autoria de Nelson Smith ou não, são preciosos. Reúnem negativos flexíveis e cópias contato. Foram reprocessados entre 1952 e 1953 pela COBAST, que gerou mapas índices. Sobre o aviador e técnico inglês, George Nelson Smith, encontram-se registros na imprensa desde 1929331. Caso raro nessa produção, refere-se a represas na Serra, em voo realizado em 4 de outubro de 1931, que traz fotos oblíquas, formando panorâmicas das escarpas. Aqui as marcas indicam um trabalho em parceria: “GNS/PHOTO.AEREO/PILOTO / J.D.CAMARGO/SANTOS”332.

    Dois anos depois, outro pequeno conjunto, com 16 fotos, em escala 1:5.000, documenta a retificação do Rio Pinheiros333. A atuação de Nelson Smith, com alguma regularidade, para um cliente como a Light & Power, indica a existência de uma demanda crescente por parte de prestadores de serviços, os quais necessitam ter controle de territórios extensos para manutenção e implantação de novas operações, e a possibilidade, assim, do estabelecimento de uma primeira leva de fornecedores de serviços especializados em fotografia aérea, em seu largo espectro.

    Se o mercado local, na década de 1930, ainda não permite que fornecedores de maior porte se fixem, com equipes e instalações estáveis, a década seguinte vê o surgimento de iniciativas de maior fôlego. Quase certo, produtores como Nelson Smith perderão espaço nos grandes centros, desaparecendo ou procurando nichos regionais334.

    Março de 1938, nota na imprensa registra avião da Sociedade Paulista de Photographias Aereas Ltda sobre Araraquara, no interior do estado de São Paulo, que realiza levantamento para planta cadastral, que será usada na remodelação dos serviços de águas e esgotos daquela cidade335. No ano seguinte, como vimos, noticia-se o mapeamento de Porto Alegre pela Condor. Essa empresa “ruma” para a nacionalização, quase certo forçada pela legislação e contexto no conflito mundial que se anuncia336. A partir de então começam a surgir novos agentes privados no setor de aerofotogrametria, que atuarão em outro panorama técnico, e em um mercado crescente com aplicações na gestão urbana, ponto que nos interessa. Surgem nomes como Empresa Nacional de Fotografias Aereas, H. Natividade, Aerofoto Cruzeiro do Sul, VASP etc.

    25 anos depois da realização do Mapa Topográfico, a municipalidade paulistana dá início a uma nova empreitada. Em 1952 a administração Armando de Arruda Pereira (1951-1953) abre a concorrência que acabará por estabelecer o consórcio VASP Cruzeiro (Vasp Aerofotogrametria S/A e Serviços Aerofotogramétricos Cruzeiro do Sul S/A)337. Serão realizados dois mapeamentos, um em escala 1:2.000 e outro em 1:10.000, cobrindo respectivamente, de início, 500 e 1.100 km2, áreas ampliadas posteriormente para incluir parte de municípios próximos. O fenômeno da metropolização ganhava escala e exigia essas alterações. Além disso, mal entregue o Mapa Topográfico, a cidade crescera, incorporando em 1935 o município de Santo Amaro.

    Um marco novo se impunha para outra geração de paulistanos, em novo contexto.
    Mosaicos
    1:1.000 | 1:5.000

    Ricardo Mendes

    Pesquisador do
    Núcleo de Produção Editorial/SPD/AHSP


    Continua > Anexos









    Para citação adote:

    MENDES, Ricardo. S.A.R.A. Brasil: restituindo o Mapa Topográfico do Município de São Paulo.
    INFORMATIVO ARQUIVO HISTÓRICO DE SÃO PAULO, 10 (37): dez.2014
    <http://www.arquivohistorico.sp.gov.br>

     
    EXPEDIENTE

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    Afonso Luz

    webdesigner
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